"Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero."
Antonin Artaud

terça-feira, 20 de abril de 2010

Primeiro há a mudança interna, estrutural, e só depois muda-se a face, a aparência.

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Algo mudou dentro
em mim.
Como extensão, mudo fora
mundo fora, mudo - de mudar
e mudo - de voz
muito porém, com fala - contradicto
mesmo que seja calada
escrita.
Pode-se gritar pela escrita?
Sim, pode-se. E grito

Algo em mim mudou
forte.

Como extensão, pequena
porém, considerável, relevante
mudo também esta cara - virtual
Mudo de c(ô)r, mudo de c(ó)r
mudo de cara.
A mudança me é cara
é-me cara, não acaba
não pára. Para quê?

Se antes era barba, agora é pele
se antes preto, agora claro
se antes mudo, agora fala
se antes antes, agora agora.
Depois sempre virá, como agora.
Preto outra vez, barba nova longa
pele, cara, agora
mudo - de mudar.

Não à morte deste espaço-pedaço
considerei-a, porém
resisto
e faço viver - vivo. Revisto:
Re-visto.
Pensei até em mudar de nome - o espaço (este)
pedaço: eu
mas nome não muda
o esqueleto continua...
o aço é traço e braço.
Fica, mesmo quando muda.

O movimento, motor da vida
a mudança, condição de existência:
água parada apodrece, fede.
O caos, a desordem, a onda
são necessários ao vivo
o fluxo, o fluxo, uso
mudo - de mudar
tensão, limite: transcendência.
Como a poesia leva a linguagem ao limite
estende, expande, entende
força-a a mudar, eu mesmo faço o mesmo
a mim e ao meu mundo
mudo-de-mudar, não mudo-de-calar
falo, de falar:
Diz-se e vive-se:
mudo.


(Vida longa à poesia!)



ps.: meu maxilar treme...

ps2.: As fotos que ilustram o fundo do título deste espaço - blog - são uma homenagem ao fotógrafo Irving Penn. As personalidades são, respectivamente, da esquerda para a direita: S. J. Perelman, Pablo Picasso, Nadja Auermann, Salvador Dalí e Woody Allen.

ps3.: O Catador (de Manoel de Barros)


"Um homem catava pregos no chão.
Sempre os encontrava deitados de comprido,
ou de lado,
ou de joelhos no chão.
Nunca de ponta.
Assim eles não furam mais – o homem pensava.
Eles não exercem mais a função de pregar.
São patrimônios inúteis da humanidade.
Ganharam o privilégio do abandono.
O homem passava o dia inteiro nessa função de catar pregos enferrujados.
Acho que essa tarefa lhe dava algum estado.
Estado de pessoas que se enfeitam a trapos.
Catar coisas inúteis garante a soberania do Ser.
Garante a soberania de Ser mais do que Ter."

ps4.: Sinto-me um catador; que ganhou os globos oculares e a faculdade da visão há pouco, como que apreciando e gozando das primeiras imagens formadas em suas retinas; como se eu enxergasse apenas há algum tempo... toda minha vontade se expande em direção ao universo da busca do sentido, seja através de imagens ou de sensações/experiências... aliás, ver é a melhor forma de viver. eu vim ver. vamos?



marcus de barros.

2 comentários:

Rodrigo de Morais disse...

Hoje penso pra mim mesmo que a verdadeira mudança é a que sobrevém do interior, esta que é capaz de se fazer perceber diferente uma mesma geografia exterior - as formas -. Quero dizer, a real mudança é aquela seguida do desejo.

Gilson disse...

Da arte de ler: Damn!

Grande abraço