"Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero."
Antonin Artaud

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

"(...) There is a girl, blabbing nothing outside my window
What do I have to show
To a world that the only way to destroy
Is to die like a baby boy
I could be happy in infinity
Of the space of my eyelid
But I know I'm somewhere else
Where the words on this page
Are better than the scribling nonsense they are,
And it would be real,
And I eat my last meal
Wish that I could feel
But now I don't even know if I'm real"




John Frusciante, letra de I'm Always.




marcus.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Erickson Luna - ”Quem tem que comandar nossa vida é nossa cabeça, o corpo que se vire para ir atrás”




Homenagem ao poeta Erickson Luna.


"Erickson Luna estava internado havia mais 30 dias no Hospital Otávio de Freitas. Era portador de pancreatite crônica. A doença foi diagnosticada quando ele sofreu uma queda e quebrou o fêmur. Aconselhado pelos médicos a abandonar a bebida, Luna foi categórico ao afirmar, segundo o amigo Ednaldo Possas, parceiro de mesa do Mercado da Boa Vista: Quem tem que comandar nossa vida é nossa cabeça, o corpo que se vire para ir atrás."

"O caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria. Esta máxima do poeta inglês William Butler Yeats bem que poderia ser o epitáfio escrito na lápide de Erickson Luna. O poeta pernambucano, considerado por amigos geracionais e outros mais jovens como o “o último dos beatniks”, morreu na madrugada desta quinta-feira aos 49 anos." (excerto de texto escrito em abril de 2007 para o JC, quando da morte do poeta)



CANTO DE AMOR
E LAMA I

Choveu
e há lama em Santo Amaro
nas ruas
nas casas
vós contornais
eu não
a mim a lama não suja
em mim há lama não suja
eu sou a lama das chuvas
que caem em Santo Amaro

Vosso Scotch
pode me sujar por dentro
cachaça não
vosso perfume
pode me sujar por fora
suor nunca
porque sou suor
a cachaça e a lama
das chuvas que caem
em Santo Amaro das Salinas


"Luna era possuidor de uma sagacidade incrível. Tendo estudado direito e jornalismo, optou por ser poeta. Não um poeta qualquer, como esses poetas intelectualóides, vazios e medíocres que estão produzindo atualmente (salvo raras excessões…). Não, Luna tinha a poesia correndo nas suas veias, transpirava poesia, suas palavras cortam, possuem sangue.

Teatro da Crueldade em pessoa, muito prazer.” Para além de Artaud, Luna encarnou em sua existência, em seu corpo, a abolição das metáforas (embora as tenha cunhado em versos, imprimiu-as em sua pele), tornando-se ele próprio um íntegro meio-homem, plenamente meio-mariposa. " (excerto de texto de André Raboni, no blog Acerto de Contas)

ECCE HOMO

Saiam da minha frente
matem-se
morram-se
deixem livre
o meu campo de visão

Me entristece conceber
a semelhança que nos une na semente
quem é que pode
ser feliz se vendo gente

Portanto
saiam da minha frente

EPITÁFIO PARA UM
BUROCRATA

Faz da gravata
a forca
a fina veste
é tua mortalha
e teu birô
o teu esquife

Do gabinete ao túmulo
vade retro burocrata



http://www.interpoetica.com/erickson_luna.htm

http://acertodecontas.blog.br/atualidades/do-moco-e-do-bebado-luna/

http://pordetrasdamalhafina.blogspot.com/2007/04/erickson-luna.html




marcus.
profundamente identificado com a afirmação (título) de Luna (e com tanto mais):
”Quem tem que comandar nossa vida é nossa cabeça, o corpo que se vire para ir atrás”.

saramago, "morri", "ressuscitei" nove horas depois.

Um ano depois


Dezembro 24, 2008 by José Saramago


“Morri” na noite de 22 de Dezembro de 2007, às quatro horas da madrugada, para “ressuscitar” só nove horas depois. Um colapso orgânico total, uma paragem das funções do corpo, levaram-me ao último limiar da vida, lá onde já é tarde de mais para despedidas. Não recordo nada. Pilar estava ali, estava também Maria, minha cunhada, uma e outra diante de um corpo inerte, abandonado de todas as forças e donde o espírito parecia ter-se ausentado, que mais tinha já de irremediável cadáver que de ser vivente. São elas que me contam hoje o que foram aquelas horas. Ana, a minha neta, chegou na tarde do mesmo dia, Violante no seguinte. O pai e avô ainda era como a pálida chama de uma vela que ameaçasse extinguir-se ao sopro da sua própria respiração. Soube depois que o meu corpo seria exposto na biblioteca, rodeado de livros e, digamo-lo assim, outras flores. Escapei. Um ano de recuperação, lenta, lentíssima como me avisaram os médicos que teria de ser, devolveu-me a saúde, a energia, a agilidade do pensamento, devolveu-me também esse remédio universal que é o trabalho. Em direcção, não à morte, mas à vida, fiz a minha própria “Viagem do Elefante”, e aqui estou. Para vos servir.






texto extraído do "caderno de saramago" (http://caderno.josesaramago.org), postagem do dia de hoje.
fiquei impressionado com os fatos, com a maneira que os comunicou e também com a velocidade de informação da internet, com tudo.
ultimamente tenho percebido o absurdo das coisas de maneira mais profunda, mais constante.
o absurdo que é estar vivo, pensar, perceber o absurdo.
tudo.
tudo já não é nada, pelo contrário, é tanto, é tanto tudo.
e é demasiado absurdo, e o quero. o busco. o encontro. o vivo.
absurdos não são mais tratados como absurdos, e sim como o que simplesmente "é".
saramago parece sentir o mesmo.







marcus.
no absurdo.

frusciante´s new record - the empyrean

Elogio ao grande musico (e poeta, sim) John Frusciante.

Blog - http://johnfrusciante.com/
Espaço musical - http://www.myspace.com/johnfrusciantemusic

"The Empyrean is a story that has no action in the physical world. It all takes place in one persons mind throughout his life. The only other character is someone who does not live in the physical world but is inside it, in the sense that he exists in peoples minds. The mind is the only place that anything can be truly said to exist. The outside world is only known to us as it appears within us by the testament of our senses. The imagination is the most real world that we know because we each know it first hand. Seeing our ideas take form is like being able to see the sun come into being. We have no equivelent to the purity of that in our account of the outside world. The outer world appears to each of us as one thing and it is always also a multitude of others. Inside to outside and outside to inside are neverending. Trying and giving up are a form of breathing."

- John



apesar do novo álbum sair apenas no dia 20 de janeiro seguinte, já existe uma música solta na internet, http://www.youtube.com/watch?v=ZZnu1696XgY.



Unreachable:

Are we
Down for the same cause?
We don't know what we stand for
When the moments start to crack
You do lose track where your head's at

I am unreachable
What do you think when your head's full?
We don't rely on what we get
We begin now where we aren't yet
Ay!

One time, hit me where I turn white
I don't mean to be polite
Uniformed, spinnin in the world to the beat of my drums
Uniformed...

One time, hit me where I turn white
I don't mean to be polite
Uniformed, spinnin in the world to the beat of my drums
Uniformed...

Reach into the darkness for what you can find
Travel great distance in your mind
The world gets stronger as you start tryin things
Turn around towards me and walk away from dying

I've run out again this, the one on my side
Were we to disappear, well, I know I've tried
You know we've tried, you know we've tried
Heyyy, shoot me
Heyyy, shoot me
Shoot me, shoot me
Hey...

Ohhhh







grande john...
merci.






marcus.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O Cigarro de Oscar Wilde






"O cigarro é o protótipo perfeito do prazer perfeito. É delicioso e ao mesmo tempo nos deixa insatisfeitos. Que mais se pode querer?"

Oscar Wilde

marcus.

Os Seres (Antonin Artaud)

mais um pra série Artaud.








[OS SERES… ]


"Os seres
não saem
para o dia exterior
só têm a força
de resplandecer
na noite subterrânea
onde se fazem.


Mas desde eternidades
passamo seu tempo
e o tempo
a fazer-se
e nem um só chegou
assim
a manifestar-se.

Vai ser preciso esperar que
a mão do Homem
os prenda e consuma
porque só
o Homem
inato e predestinado
tem
esta temível
e
inefável
capacidade:

Fazer o corpo humano sair
para a luz da natureza
mergulhá-lo vivo
no clarão da natureza
onde o sol acabará enfim
por desposá-lo."

Antonin Artaud



marcus.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Mark Rothko







Pintor do expressionismo abstrato à quem muito admiro. Nascido na Rússia em 1903, imigrou para os Estados Unidos onde fez sua carreira como artista. Olhar para uma pintura de Rothko é como olhar para uma fronteira do universo, onde ser se faz não-ser e luz se faz vácuo. São pinturas capazes de comunicar o “quase”-incomunicável em seu jogo sutil de forma e cor (ou ausência de cor), não se escreve a respeito, se abstrai. Suicidou-se em 1970, sua carreira em pleno auge.

Antonin Artaud
















"Quem sou eu?
De onde venho?
Sou Antonin Artaud
e basta que eu o diga
Como só eu o sei dizer
e imediatamente
hão de ver meu corpo
atual,
voar em pedaços
e se juntar
sob dez mil aspectos
diversos.
Um novo corpo
no qual nunca mais
poderão esquecer.

Eu, Antonin Artaud, sou meu filho,
meu pai,
minha mãe,
e eu mesmo.
Eu represento Antonin Artaud!
Estou sempre morto.

Mas um vivo morto,
Um morto vivo.
Sou um morto
Sempre vivo.
A tragédia em cena já não me basta.
Quero transportá-la para minha vida.

Eu represento totalmente a minha vida.

Onde as pessoas procuram criar obras
de arte, eu pretendo mostrar o meu
espírito.
Não concebo uma obra de arte
dissociada da vida.

Eu, o senhor Antonin Artaud,
nascido em Marseille
no dia 4 de setembro de 1896,
eu sou Satã e eu sou Deus,
e pouco me importa a Virgem Maria."






marcus.

Palavras deJosé Saramago, em seu Caderno

Palavras

Dezembro 17, 2008 by José Saramago

Não pode haver conferência de imprensa sem palavras, em geral muitas, algumas vezes demasiadas. Pilar insiste em recomendar-me que dê respostas breves, fórmulas sintéticas capazes de concentrar longos discursos que ali estariam fora de lugar. Tem razão, mas a minha natureza é outra. Penso que cada palavra necessita sempre pelo menos outra que a ajude a explicar-se. A coisa chegou a um ponto tal que, de há tempos a esta parte, passei a antecipar-me às perguntas que supostamente me farão, procedimento facilitado pelo conhecimento prévio que venho acumulando sobre o tipo de assuntos que aos jornalistas mais costumam interessar. O divertido do caso está na liberdade que assumo ao iniciar uma exposição dessas. Sem ter de preocupar-me com os enquadramentos temáticos que cada pergunta específica necessariamente estabeleceria, embora não fosse essa a sua intenção declarada, lanço a primeira palavra, e a segunda, e a terceira, como pássaros a que foi aberta a porta da gaiola, sem saber muito bem, ou não o sabendo de todo, aonde eles me levarão. Falar torna-se então numa aventura, comunicar converte-se na busca metódica de um caminho que leve a quem estiver escutando, tendo sempre presente que nenhuma comunicação é definitiva e instantânea, que muitas vezes é preciso voltar atrás para aclarar o que só sumariamente foi enunciado. Mas o mais interessante em tudo isto é descobrir que o discurso, em lugar de se limitar a iluminar e dar visibilidade ao que eu próprio julgava saber acerca do meu trabalho, acaba invariavelmente por revelar o oculto, o apenas intuído ou pressentido, e que de repente se torna numa evidência insofismável em que sou o primeiro a surpreender-me, como alguém que estava no escuro e acabou de abrir os olhos para uma súbita luz. Enfim, vou aprendendo com as palavras que digo. Eis uma boa conclusão, talvez a melhor, para este discurso. Finalmente breve.

Publicado em O Caderno de Saramago







marcus.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008





saudações ao velho ateu, demasiado lúcido a quem tanto admiro.
aplausos calados e palavras mudas ao blog que ele mantém a partir do pedido de algum familiar mais ligado a rede da internet.
as palavras colocadas lá são de um valor incomensurável.
josé saramago, caderno de josé saramago, http://caderno.josesaramago.org/

lá encontrei isso, na data de ontem:

Borges

Dezembro 15, 2008 by José Saramago

Maria Kodama voltou a Portugal, desta vez para assistir à inauguração de um monumento a Jorge Luis Borges. Havia bastante público no Jardim do Arco do Cego, onde a memória foi implantada. Uma banda filarmónica tocou o hino deArgentina e também, não o hino nacional português, mas o hino da Maria da Fonte, expressão musical da revolução a que foi posto esse nome por alturas de 1846-47 e que ainda hoje continua a ser tocada em cerimónias civis e militares. O monumento é simples, um bloco vertical de granito da melhor qualidade no qual se abre um vão onde uma mão dourada, molde directo da mão direita de Jorge Luis Borges, segura uma caneta. É simples, evocativo, muito preferível a um busto ou uma estátua em que nos cansaríamos a procurar semelhanças. Improvisei umas quantas palavras sobre o autor de Ficções, a quem continuo a considerar como o inventor da literatura virtual, essa sua literatura que parece ter-se desprendido da realidade para melhor revelar os seus invisíveis mistérios. Foi um bom princípio de tarde. E Maria Kodama estava feliz.












marcus.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Poema: A mulher A Fotografia e O silêncio da obra

DOIS ESTUDOS



1
Tu és a antecipação
do último filme que assistirei.
Fazes calar os astros,
os rádios e as multidões na praça plúbica.
Eu te assito imóvel e indiferente.
A cada momento tu te voltas
e lanças no meu encalço
máquinas monstruosas que envenenam reservatórios
sobre os quais ganhaste um domínio de morte.
Trazes encerradas entre os dedos
reservas formidáveis de dinamite
e de fatos diversos.



2.
Tu não representas as 24 horas de um dia,
os fatos diversos,
o livro e o jornal
que leio neste momento.
Tu os completa e os transcendes.
Tu és absolutamente revolucionária e criminosa,
porque sob teu manto
e sob os pássaros de teu chapéu
desconheço a minha rua,
o meu amigo e meu cavalo de sela.




João Cabral de Melo Neto







Quanto insinua a (grande) fotografia! A mim veio dizer sobre a arte muda, e a superação do aplauso.

De Morais

(Praticando a incompreensão Texto II: com Tensão de Grave.)



A VISÃO MUSICAL DE MUNDO

Para aquele que musica o mundo, toda emoção ganha forma sonhada de acordes. E toda emoção sonhada/vivida em acordes é tudo aquilo que também (não) poderia ser dito por ele, sendo transposto por notas, as Suas notas. Para aqueles que não musicam o mundo, mas vive um mundo musicado nos sonhos acordados por emoções de outrem, tornar-se-á cabível assisti-los/ouvi-los assiduamente. Senti-los nos parâmetros dos pensamentos próprios, sem jamais ousar interpretar, o que é o incomensurável incômodo do músico de não conseguir por palavras ministrar suas angústias, falar de suas paixões ou indagar suas próprias opiniões de mundo, esclarecidas para si unicamente no balanço do pendulo emotivo da alma, substanciado no calabouço das notas musicais. A difícil tarefa de mostrar uma canção - falo aqui das que não transmitem ideologias. - é o doloroso saber que de suas emoções arrepiantes - seu real fundamento de musicar - (seja sobre suas músicas, seja sobre sua interpretação das musicas alheias), tornar-se-á para grande maioria apenas embalo ocasional, quando não “platéia” em contemplação por adorno. Aquilo que é feito com muito amor, não é condição de fácil exposição. O talentoso não jorra o seu amor o doando à toa, como queda d’água por cachoeiras à mercê de vislumbres para fotografias. O homem que sente amor e o manifesta por arte, arde de angustia se perceber-se sujeito a critérios reducionistas; ele se omite, e tudo guarda. A incompreensão para o artista desta ótica é forte fonte de inspiração; por ser demasiado dolorosa condição de exorcizar-se no mundo, e um meio de se cumprir, no traquejo com a dor, uma via facilitadora de concentração, exposição.


A música, para o talentoso que silencia seus pensamentos em canalização com o instrumento, vivencia nele a extraterritorialidade atemporal que há no planisfério do mundo (a)tonal, senão da existência em si, como prova maior de que arte nenhuma, nesse lugar, em si existe para o outro. O seu contato de si para o outro se dá no córrego de suas notas através do rio de nada para aquele que puder a este enxergar - aqui metaforizando a condição inapropriada de reprodução da linguagem -. Em oposição, a tradução dos sons por legendas, é, no entanto mais uma tentativa de empirismo do homem e uma atribuição de valor metodológico a, nesse caso, toda construção musical. Por mais eficaz que se faça o método - haverá os que no método estagnarão- a forma sonhada das notas, em gráficos, para aqueles que as realizam como tradução e linguagem momentânea de si não significará nada. Os sons sonhados se desenhados, tornar-se-á textos, se repetitivos, salmos. Mas se linguagem for por emoção do instante uma canção, não haverá necessidade de cálculos. Este espírito de arte não está enclausurado no perpetuar, na postura de anseio de ter sua “fala” por outros corpos, seu texto por outras mãos, seus salmos por outros anciões. Aqui se vê uma cisão da música no artista: como linguagem aos indiferentes à sua condição de arte como status, e linguagem aos que condicionam suas emoções sonhadas aos métodos de gráficos calculados; estes almejam vender-se em sua arte.


Se não pensarmos em tragédias, o amor é o único mecanismo que atinge dois extremos num talentoso: são estes a capacidade de anular ou intensificar alienadamente seu contato com suas “obras”. O talentoso está sempre renascendo de suas próprias invenções, criações. A autocrítica realça-se no impacto da fala pela obra nos sujeitos indiferentes a ela. A sensação de impotência sobre o outro, causa no âmago uma cobrança rígida de superação do que não existe. Não existe, pois o talento musicado consiste no vislumbre do ouvinte que atenta, portanto na coerente impossibilidade de interpretação precisa da emoção da obra, e na não intenção do artista em revelar seu irrevelável - ato nobre de não atribuir a sua arte características terapêuticas, quando na angustiante incompreensão, portanto, no sofrimento, é onde reside sua fonte de obra base. Quando se fala na coerente impossibilidade de interpretação, fala-se do absurdo ato tendencioso humano que é a vontade de capturar o fenômeno, revelar, descobrir, acertar. Nada fixo está revelado numa nota musical. Tudo está aberto às invenções da mente também criadora que observa. A nota musical está, mas e não é de uma mesma forma para todo observador. A arte não é o objeto, é a imagem – aqui possivelmente recriada. Não há acerto de reprodução de imagem no campo das notas em melodia do desejo. Capturá-la é classificá-la, uma determinante incabível.


Aquele que paira no delírio das notas está fadado a um silencioso labirinto pelo arrepio dos tons, por uma linguagem do infinito, e uma sensibilidade que não marca ou transparece origem de sentimentos, e sim lugares de manifestações avulsas.

De Morais

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Quando o Desejo é Gritar

Palavras, cores, sons, inexoravelmente ampliados ao estado de espírito do tudo ou nada, fluindo da mesma fonte, mesma origem. Do mesmo poço de tormento e êxtase que me trouxe a vida e tudo o que nela se possa encontrar. Estou aqui para ser um com aquilo que nome não se pode dar, Estou aqui para abstrair deus nas coisas, deus em mim. Estou aqui para ser o nada feito tudo, feito tudo, feito tuuuuudo. É o roçar do arco nas cordas de um cello, de um contrabaixo, até mesmo de um violino, aquela sonoridade aveludada, da textura da seda, do cobertor, da gota d’água que desliza em minha garganta seca. Tudo o mesmo, o mesmo tudo. Sou hoje um par de olhos, lentamente a piscar. Eles se abrem, se fecham, e sem pressa voltam a se abrir novamente. A luz que perfura minhas retinas aos poucos vai dando espaço ao silêncio visual, e o que os olhos vêem a mente recria, com direito a narrativas e distorções, eis que eu começo a sonhar e sonhando penso estar acordado, mas não.

E as horas se fazem minutos, os minutos se fazem dias e todos eles se põem a escorrer por dentro de minhas narinas, coriza temporal com direito a um lencinho de bolso. Começo então a assoar aquelas pequenas estruturas mesuráveis denominadas relógios, que prepotência de vossas partes em graduar tão friamente o transcorrer de uma dimensão. Meu córtex estupefato melhor aprecia seu estado de teia, mosquiteiro, de rede de pescador, translúcido ao fluxo de uma quase atemporalidade, o agora... Não, não, eu quero dizer O AGORA! Existiria um infinitésimo instante mais atemporal do que... o AGORA? Mal chegou já partiu, já disse adeus e foi embora. Afinal quanto tempo dura esse agora? Hum, parece-me que o agora é tudo o que de fato existe... Eventos passados e a antecipação do que há por vir, isso quem dá forma somos nós... Nós os intangiveis, completos incompletos quando, de fato, a vida está aqui sendo exatamente o que ela é.. e ela É. Tamanha esta sombra, esta luz, sinto-me como um barco sem vela desejando por mais vento, ou até mesmo um micofone, consciente de sua própria voz, se pondo a microfonar.
-
Gilson

terça-feira, 2 de dezembro de 2008







"Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero."

antonin artaud






marcus.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

(praticando a incompreensão)



O peso sobre mim é a grama de uma ilusão.

O peso sobre mim
é o leve sobre você.
A voz que me amedronta
é um sopro pra você.
O texto que me arrepia
é loucura pra você.
O cheiro que me enjoa
é uma delícia pra você
O ruído que me agonia
é boa música pra você.
A razão que me desvia
é o caminho errado por você.
O objeto que queimo azul
lê-se amarelo por você.
As fotos-sonhos de minha vida
é papel borrado pra você.
O filme que me angustia
não é lançamento pra você.
A festa que me anima
não é festa por você.
A luz do astro que me guia
é uma religião para você.

Mas a dor de cair no mundo
foi dor pra mim e pra você.
Foi nosso (des)encontro oriundo
de uma breve conclusão.
Foi um cadeado sem chave
sucumbido num permanecer.
Toda uma existência desejada
Amputada em dois corações.
No achar sobre um
que insistirá no outro sempre ser.
Na saudade de um absurdo
que estará sempre para acontecer.

(Sua dor e amor trouxe ao mundo
mais um conto sem conclusão.
Mas não a primeira história dilacerada
em metade de (in)sucessos
e a outra de ilusões.)

sonhores, perdoem a ousadia minha de todo dia.

de morais

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

(...)
A mais íntima e mais frequente fusão entre uma espécie de 

simbólica dos gestos e o som denomina-se "linguagem". A essência 

da coisa é simbolizada na palavra por meio do som e de sua 

cadência, da força e do ritmo de sua sonorização; a representação 

paralela, a imagem, o fenômeno da essência são simbolizados por 

meio do gesto da boca. Os símbolos podem e precisam ser múltiplos; 

eles crescem, porém, instintivamente e com grande e sábia 

regularidade. Um símbolo entendido (gemerkt) é um "conceito": 

porque ao ser retido na memória o som se esvai completamente, no 

conceito só é guardado o símbolo da representação paralela. O que 

se pode designar e diferenciar é o que se "concebe".
(...)
A partir do grito com os gestos acompanhantes surgiu a 

"linguagem": aqui a essência da coisa é expressa por meio da 

entonação, da força, do ritmo, enquanto a representação paralela, 

a imagem da essência, o fenômeno são expressos por meio dos gestos 

da boca.
(...)
Gestos e som!
Prazer comunicado é arte.
O que significa a linguagem dos gestos: é a linguagem por meio de 

símbolos inteligíveis universalmente, formas de movimentos 

reflexos. O "olho" conclui imediatamente o estado que produz os 

gestos.
Assim é com os sons instintivos. O ouvido conclui imediatamente. 

Esses sons são símbolos.
(...)




No que cabe à imagem, fragmentos tirados do "A Visão Dionisíaca do 

Mundo", primeiro livro de Friedrich Nietzsche.




marcus.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

sobre cabral e os cogumelos

Antiode (contra a poesia dita profunda)


Poesia, te escrevia:
flor! conhecendo
que és fezes. (Fezes
como qualquer,

gerando cogumelos
raros, frágeis, cogu-
melos) no úmido
calor de nossa boca.

Delicado, escrevia:
flor! (Cogumelos
serão flor? Espécie
estranha, espécie

extinta de flor, flor
não de todo flor,
mas flor, bolha
aberta no maduro).

Delicado, evitava
o estrume do poema,
seu caule, seu ovário,
suas intestinações.

Esperava as puras,
transparentes florações,
nascidas do ar, no ar,
como as brisas.




João Cabral de Melo Neto

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

comentário sobre o "Amor fantasma de um louco jovem Sonhador":


sinto.
imerso nas tuas palavras.
nos teus devaneios, nos teus nadas.
que de tanta semelhança,
se fazem meus.

aquilo que poderia ser nuvem, 
e não é.
que poderia ser jovem,
e mesmo sendo, não é.
que poderia ser,
entretanto, apenas o é pela metade.

um eu pela metade,
e avesso.
vivendo um capricho da imaginação.





marcus.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Amor fantasma de um louco jovem Sonhador


Sonhar um amor sem rosto, mas com muito gosto
e gozo, é sonhar um amor melodia.
Que boa fantasia não "sonhar" um rosto;
Que grande alegria poder forjar um
gosto.

Vislumbrar um lugar maravilhoso e impossível,
nos abraços de um amor intangível, é fotografar
a melodia de uma canção que cansa o coração
depois de uma lágrima doída, tão temível.

Você que jaz de uma
película onírica,
não morreu por não nascer,
não sofreu porque nem amou,
agonizou como um fantasma egoísta
os remorsos de um nascido, amado, amador

Sonhar o vislumbre de você
foi mergulhar num achar-que-pode,
se aprofundar numa vontade de morrer
por tanto amar esse Nada que Dói.

Nada é você,
que poderia ser nuvem, mas não é.
que poderia ser mais quente, e não o é.
que poderia ser - finge! - a metade do que não sou.

Você que não é
Nada e faz sentir, torna-se Música. Musa de um Louco Jovem Sonhador.

R

quinta-feira, 6 de novembro de 2008


" o teatro é uma poesia posta em prática, ou seja, transformada em 

realidade. A finalidade do teatro é, portanto, a mesma de toda 

linguagem verdadeira: trazer a vida para dentro da arte, tornando-a 

real e, simultaneamente, elevar a vida - degradada no cotidiano - 

até o plano da arte."


Claudio Willer, sobre Antonin Artaud, em se tratando de
"O Teatro e Seu Duplo" e "O Teatro de Serafim".




Foto: arctic monkeys (capa interna de um cd).







marcus.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

a partir do que está abaixo


o pessimismo é um dos mais delicados conceitos a se discutir. talvez, até, parte de um discurso que nunca pode ser compreendido por completo, descoberto nem explicado. 
mas, não posso deixar de comentar que ele sempre anda ao meu lado, como uma sombra, que às vezes, com a luz vindo de vários lados, desaparece e se torna quase que imperceptivel, e por outras vezes, com apenas uma luz direcional, se torna tão evidente.. 
porém também acredito que o bom convívio, até com esse pessimismo, me leva a continuar os passos seguidos de outros passos, até quem sabe quando, mudando de caminhos, seguindo outros antigos caminhos, novos caminhos, atalhos, labirintos... 
no labirinto me sinto desenvolvendo como que um poder sobre a família das decisões; no labirinto, assim como na ilha, me vejo numa espécie de casulo, ou de escafandro, onde me penso, me repenso, me medito e que por vezes saio à caça. 
meu pessimismo eu abraço como um amigo, que pode me dar lições como um pai (que não há) e que por vezes me deixa liberto (como um pródigo) pra ir onde quiser. apesar de não esquecer que sempre estou voltando pra casa. 
é como uma tristeza confortável, que por tanto é tão semelhante à felicidade, que até se define em tal conceito alegre.  
não posso deixar de salientar que meu sono é tranquilo, acho que isso minimiza a confusão.




marcus.

sábado, 1 de novembro de 2008

"O papel está hoje com uma abominável falta de imaginação.
Continua apenas, olhando-me: vazio, mais quadrado do que nunca."

-Mário Quintana

paulo leminski

"quatro dias sem te ver
e não mudaste nada 
falta açúcar na limonada
me perdi da minha namorada 
nadei nadei e não dei em nada
sempre o mesmo poeta de bosta
perdendo tempo com a humanidade"


pedaços de leminski





marcus.

leminski

"quatro dias sem te ver e não mudaste nada  falta açúcar na limonada me perdi da minha namorada  nadei nadei e não dei em nada sempre o mesmo poeta de bosta perdendo tempo com a humanidade"


pedaços de leminski

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Olhar de Teto
Trancado no pijama do meu quarto
As folhas voam em branco.
Mísérias gloriosas enfeitam
Meus nadas.

De sapatos, o quarto
Quer que eu queira;
E, eu não quero.

Me pego em embates inúteis
Com minhas paredes.
Mas, elas são molengas;
E, eu derrubá-las-ia
Acaso houvesse-me ímpeto.

De resignado, eu calo.

Olho os olhos do meu teto
Que me olham...
E, eu finjo não vê-los...

Olhar de teto: olhar olblíquo.





André Raboni
http://www.desterritorio.blogspot.com/





marcus.

a fome de dias depois (André Raboni)

A fome de dias depois

Aquele ser não tinha nome. Nem números. Ouvira certa vez um nome, que já lhe parecia, agora, algo estranho e irreconhecível. De um reconhecimento breve e distante, que não sabia identificar ao certo de onde provinha. Tudo lhe era estranho.Comia restos quando restava algo nos tambores de plástico que repousavam gordos nos magros asfaltos. Dia a dia, mais menos restos lhe restava. Sobravam-lhe as faltas de resto, que devorava como se fossem belos pratos nobres. Não distinguia gostos, pois os deuses lhe subtraíram as faculdades do paladar.Sua sorte é que lhe restavam as pernas (apesar de só possuir um braço e meio). Embora magras, serviam-lhes para seu único objetivo: andar em busca de restos de pedaços.E assim passavam seus dias trôpegos.Quando, porém, viu-se na metrópole dos desertos, ele já não encontrava nem pedaços de restos. Menos e menos tambores de restos lhe cruzavam o caminho. Sedento de fome (que lhe era o único motor de sua existência), ele caminhava.E caminhava, caminhava...Já não tinha resto com que se deleitar. Sobravam-lhe todas as faltas de pedaços. Na falta plena, passou a comer seus próprios produtos: as fezes.Porém, a cada dia obrava menos. Passou, então, a armazenar os excedentes de sua produção. Estocava-os para comer sempre que sentisse fome. E comia embuído com muita dignidade aquela pasta marrom que acumulava em sacos plásticos envelhecidos pelo calor e pelo tempo.No entanto, percebeu que a cada dia sua produção diminuía mais e mais. Lembrara-se da única vez que haviam lhe ensinado alguma coisa. Lembrava, ainda que vagamente, uma frase:"Seus órgãos consomem seus alimentos."Não sabia ao certo o que eram órgãos. Mas, sabia que essas coisas estavam dentro de seu corpo. Elaborou, entredentes, um plano, chegando à uma conclusão:"Ou acabo com esses malditos órgãos, ou eles acabam com meus alimentos."E, assim, detalhou seu plano riscando desenhos no chão das areias-de-seu-deserto.Assim, iniciou seu plano, rasgando a barriga e retirando pedaços de carne (que sangravam muito). Fora juntando esses pedaços enquanto retirava outros mais. Ao fim do processo, estava tonto e com fome.Recostou as carnes da barriga, e envolveu-as com um pano velho e sujo que havia preparado especialmente para aquela ocasião.Ao fim, deitou para descansar um pouco. Minutos depois, acordou, e sentia muita fome. Vendo todas aquelas suculentas carnes que repousavam ainda quentes ao seu lado, devorou-as como nunca antes havia se deleitado...No dia seguinte, percebeu que de fato sua massa fecal havia aumentado. Percebeu que seu idéia tinha sido genial, e dado mais do que certo.Passou alguns dias sem andar, pois estava muito fraco. Mas, logo se sentiu revigorado - e obrando como nunca. Jamais tivera banquetes tão ricos.Ele regressou de seu deserto, para ter com os outros seres. Sua aparência nunca fora das melhores. Agora, então, estava pior que nunca. Envelhecera rapidamente. No seu trajeto, retornando do seu deserto, não encontrara nenhum'alma viva - que dirá corpos...Desfaleceu-se pouco a pouco, nas bordas de seu deserto. Avistara entre o sol e a sombra, um corpo de homem. Era semelhante a um componente de algum órgão do ministério, pois vestia farda, e estampava um brilhante crachá...Tal homem, possesso que estava de piedade, resolveu dar cabo no sofrimento que supunha ser o daquele ser, aplicando-lhe golpes certeiros em sua cabeça, com um porrete de pau enorme - em nome de Deus.Dias depois, estavam alguns outros seres a devorar aquele corpo-sem-órgãos.

Texto de André Raboni
em http://www.desterritorio.blogspot.com/



marcus.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

uma andróide.
onde se percebe o sentimento?
uma mulher?



continua sem perceber? 

percebe?
um don juan.
se vai.



2046









marcus.

domingo, 5 de outubro de 2008

Embriaguem-se (Charles Baudelaire)


"EMBRIAGUEM-SE

    É preciso estar sempre embriagado. Aí está: eis a única questão. Para não sentirem o fardo horrível do Tempo que verga e inclina para a terra, é preciso que se embriaguem sem descanso.

    Com quê? Com vinho, poesia ou virtude, a escolher. Mas embriaguem-se.

    E se, porventura, nos degraus de um palácio, sobre a relva verde de um fosso, na solidão morna do quarto, a embriaguez diminuir ou desaparecer quando você acordar, pergunte ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que flui, a tudo que geme, a tudo que gira, a tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que horas são; e o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio responderão: "É hora de embriagar-se! Para não serem os escravos martirizados do Tempo, embriaguem-se; embriaguem-se sem descanso". Com vinho, poesia ou virtude, a escolher."

Charles Baudelaire.






essa já foi postada neste espaço virtual certa vez.
mas senti que merecia uma releitura.
para ver o entendimento, talvez, se refazer.

marcus.

PS.: IMAGEM>> Caravaggio - S Jeronimo

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Tirinhas: Alone


essa eu não poderia deixar passar...




marcus.

Denúncias: Duas denúncias contra as câmeras.

1. O sofrimento vira novela.




2. Você está sendo filmado.



Denúncia a tal abuso.
Grito pelo direito de vida livre das câmeras.







marcus.

Tirinhas: Malvados




marcus.

Série: Textos de Antonin Artaud

Com a postagem de alguns textos de Artaud, continuando uma série que na verdade já teve início há alguns dias, quando postei o texto sobre "A Liquidação do Ópio", tenho como intenção de compartilhar, divulgar ou apenas transcrever o que leio e que vem do espírito deste mais que conturbado e polêmico escritor/poeta/pensador que tanto me satisfaz ao passo que confunde ainda mais o meu também espírito.
Desta vez transcrevo a "Carta aos Reitores das Universidades Européias", que faz parte dos Manifestos e Cartas do Período Surrealista, do qual também faz parte o texto "Segurança Pública, A Liquidação do Ópio", que transcrevi dias atrás aqui.




"Carta aos Reitores das Universidades Européias

Senhores Reitores,
Na estreita cisterna que os Srs. chamam de "Pensamento", os raios espirituais apodrecem como palha.
Chega de jogos da linguagem, de artifícios da sintaxe, de prestidigitações com fórmulas, agora é preciso encontrar a grande Lei do coração, a Lei que não seja uma lei, uma prisão, mas um guia para o Espírito perdido no seu próprio labirinto. Além daquilo que a ciência jamais conseguirá alcançar, lá onde os feixes da razão se partem contra as nuvens, existe esse labirinto, núcleo central para o qual convergem todas as forças do ser, as nervuras últimas do Espírito. Nesse dédalo de muralhas móveis e sempre removidas, fora de todas as formas conhecidas do pensamento, nosso Espírito se agita, espreitando seus movimentos mais secretos e espontâneos, aqueles com um caráter de revelação, essa ária vinda de longe, caída do céu.
Mas a raça dos profetas extinguiu-se. A Europa cristaliza-se, mumifica-se lentamente sob as ataduras das suas fronteiras, das suas fábricas, os seus tribunais, das suas universidades. O Espírito congelado racha entre lâminas minerais que se estreitam ao seu redor. A culpa é dos vossos sistemas embolorados, vossa lógica de 2 mais 2 fazem 4; a culpa é vossa, Reitores presos no laço dos silogismos. Os Srs. fabricam engenheiros, magistrados, médicos aos quais escapam os verdadeiros mistérios do corpo, as leis cósmicas do ser, falsos sábios, cegos para o além-terra, filósofos com a pretensão de reconstituir o Espírito. O menor ato de criação espontânea é um mundo mais complexo e revelador que qualquer metafísica.
Deixem-nos pois, os Senhores nada mais são que usurpadores. Com que direito pretendem canalizar a inteligência, dar diplomas ao Espírito?
Os Senhores nada sabem do Espírito, ignoram suas ramificações mais ocultas e essenciais, essas pegadas fósseis tão próximas das nossas próprias origens, rastros que às vezes conseguimos reconstituir sobre as mais obscuras jazidas dos nossos cérebros.
Em nome da vossa própria lógica, voz dizemos: a vida fede, Senhores. Olhem para seus rostos, considerem seus produtos. Pelo crivo dos vossos diplomas passa uma juventude abatida, perdida. Os Senhores são a chaga do mundo e tanto melhor para o mundo, mas que ele se acredite um pouco menos à frente da humanidade."



PS.: anexo 1

dédalo s. m. adj.
dédalo
do Lat. Daedalu, n., p. s. m.,
labirinto; encruzilhada; confusão; complicação.
do Lat. daedalu adj., ant.,
engenhoso; complicado; executado com arte; ricamente adornado.




marcus.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Eclipse

All that you touch
All that you see
All that you taste
All you feel.
All that you love
All that you hate
All you distrust
All you save.
All that you give
All that you deal
All that you buy,
Beg, borrow or steal.
All you create
All you destroy
All that you do
All that you say.
All that you eat
And everyone you meet
All that you slight
And everyone you fight.
All that is now
All that is gone
All thats to come
And everything under the sun is in tune
But the sun is eclipsed by the moon.

There is no dark side of the moon really. matter of fact its all dark.





marcus.
impressionado (depois de tanto) com a profundidade pinkfloydiana.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008



O benevolente

Quand ils sont venus
chercher les communistes,
je n’ai rien dit :
je n’étais pas communiste.

Quand ils sont venus
chercher les syndicalistes,
je n’ai rien dit :
je n’étais pas syndicaliste.

Quand ils sont venus
chercher les juifs,
je n’ai rien dit :
je n’étais pas juif.

Quand ils sont venus
chercher les catholiques,
je n’ai rien dit :
je n’étais pas catholique.

Puis ils sont venus me chercher
et il ne restait plus personne
pour dire quelque chose.

Louis Needermeyer - Dachau, 1942


O Benevolente

Quando eles vieram
à procura dos comunistas,
eu não disse nada:
eu não era comunista.

Quando eles vieram
à procura dos sindicalistas,
eu não disse nada:
eu não era sindicalista.

QUando eles vieram
à procura dos judeus,
eu não disse nada:
eu não era judeu.

Quando eles vieram
à procura dos católicos,
eu não disse nada:
eu não era católico.

Então eles vieram à minha procura
e não restava mais ninguém
para dizer qualquer coisa.

Louis Needermeyer - Dachau, 1942

marcus.

Cansaço

O que há em mim é sobretudo cansaço -
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...


Álvaro de Campos






marcus.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

dispensa comentários..


marcus.
Poemas sobre a cidade do Recife e sobre a cidade de Bonito.
Me saiu um dia desses no caderno, sem que eu esperasse.



Recife.

Apartamento. Cigarros. Caos.
Papeis. Desenhos. Livros.
Borges. Labirinto. Casares. Ilha.
Imaginação. Delírio. Nu.

Amigos. Diálogos. Caos?
Vinho. Drogas. Ópio?
Cigarros. Coca-cola. Pague-menos.
Algodão. Cocaína? 
Sala. Quarto.
Amigos. Livros. Caos?

Pseudo-intelectualidade. Universidade.
Falsa classe-média. Empregos.
Desemprego. Salário. Mesada.
Gorjeta. Cigarros. Caos.






Bonito.

Belo. Esverdeado. Claro. Escuro. Frio. Chuvoso.
Agradável. Saudade. Cogumelos!
Sentindo. Sendo. Estando. Único.
Absurdo! Aprazível. Real. Delírio.

Raro. Belo. Verde. Azul.
Preto. Absurdo!
Branco. Amarelo. Nascendo. Amanhecendo.
Sendo. Vivendo. Cheirando. Nascendo. Sendo.
Apenas sendo! Estando. Sem nome.
Com vida. Meio-dia. Comendo.

Fruta. Vermelho. Amarela. Laranja.
Rosa. Árvore. Absurdo!
Tarde. Laranja. Amarelo. Violeta. Azul. Roxo.
Anoitecendo. Sendo! Apenas sendo. 
Preto. Sendo. Dormindo. Acalmando. Vivendo. 
Absurdo.






marcus T.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Comentário e Ficção

Quando a emotividade é uma filosofia fisiológica.

A emotividade que antecede os minutos do sono, ou o silêncio da noite, no silêncio de si, que não consegue resistir (silenciosamente) ao claro do dia e a agitação própria, é uma filosofia fisiológica; tudo que caracteriza a face de um palhaço. Essa sua filosofia é a sua faca, no sentido de que para alguns somente assim é possível se permitir “intimamente” a questões sobre si, e até mesmo sobre si para o outro, para o mundo, de modo que quando o dia nasce às palavras, pode-se ser queimada àquela imagem, se ganha aspecto risonho à conduta de crueza emotiva através do novo homor que padeceu o tal "pesar". O termo fisiológico é bem empregado pela sua justificação da abertura - através dessa “faca” - no momento de inércia da mente e de
scanso do corpo – ou antagônico a isso (através da tinta) no caso do palhaço e sua atuação-, que dá passagem a sua “filosofia do corte” no ato de ser. Porque é nisso que resulta. Se feito e dito é o que acontece quando já à luz do dia - quando mesmo já sem máscara-, ai realmente se soa honestamente interno, de alma, para o outro e para o mundo, causando seu efeito puro. Perdido de roupagem fictícia vindo à tona com cara para os olhos, cru.

Mas, roupagem fictícia? Crueza? Quem disse que o outro é senão um palhaço constante trazendo você para seu show, como um solitário experimental?
O tolo não hesita à máscara do outro.



Rodrigo

domingo, 10 de agosto de 2008


Monica Bellucci

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Antonin Artaud





Tenho a intenção declarada de encerrar o assunto de uma vez por todas, para que não venham mais nos encher a paciência com os assim chamados perigos da droga.


Meu ponto de vista é nitidamente anti-social. Só há uma razão para atacar o ópio. Aquela do perigo que seu uso acarreta ao conjunto da sociedade. Acontece que este perigo é falso. Nascemos podres de corpo e alma, somos congenitamente inadaptados; suprimam o ópio não suprimirão a necessidade do crime, os cânceres do corpo e da alma, a inclinação para o desespero, o cretinismo inato, a sífilis hereditária, a fragilidade dos instintos; não impedirão que haja almas destinadas a seja qual for o veneno, veneno da morfina, veneno da leitura, veneno do isolamento, veneno do onanismo, veneno dos coitos repetidos, veneno da arraigada fraqueza da alma, veneno do álcool, veneno do tabaco, veneno da anti-sociabilidade.


Há almas incuráveis e perdidas para o restante da sociedade. Suprimam-lhes um dos meios para chegar à loucura: inventarão dez mil outros. Criarão meios mais sutis, mais selvagens; meios absolutamente desesperados.


A própria natureza é antisocial na sua essência - só por uma usurpação de poderes que o corpo da sociedade consegue reagir contra a tendência natural da humanidade. Deixemos que os perdidos se percam: temos mais o que fazer que tentar uma recuperação impossível e ademais inútil, odiosa e prejudicial.


Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero. Pois seria preciso, inicialmente, suprimir esse impulso natural e oculto, essa tendência ilusória do homem que o leva a buscar um meio, que lhe dá a idéia de buscar um meio para fugir às suas dores. Além do mais, os perdidos são perdidos por sua própria natureza; todas as idéias de regeneração moral de nada servem; há um determinismo inato, há uma incurabilidade definitiva no suicídio, no crime, na idiotia na loucura; há uma invencível corneação entre os homens; há uma fragilidade do caráter; há uma castração do espírito.


A afasia existe; a tabes dorsalis existe; a meningite sifilítica, o roubo, a usurpação. O inferno já é deste mundo e há homens que são desgraçados, fugitivos do inferno, foragidos destinados a recomeçar eternamente sua fuga. E por aí afora.


O homem é miserável, a carne é fraca, há homens que sempre se perderão. Pouco importam os meios para perder-se: a sociedade nada tem a ver com isso. Demonstramos - não é? - que ela nada pode, que ela perde seu tempo, que ela apenas insiste em arraigar-se na sua estupidez. Aqueles que ousam encarar os fatos de frente sabem - não é verdade? – os resultados na proibição no álcool nos Estados Unidos. Uma superprodução da loucura: cerveja com éter, álcool carregado com cocaína vendido clandestinamente, o pileque multiplicado, uma espécie de porre coletivo. Em suma, a lei do fruto proibido.


A mesma coisa com o ópio. A proibição, que multiplica a curiosidade, só serviu aos rufiões da medicina, do jornalismo, da literatura. Há pessoas que construíram fecais e industriosas reputações sobre sua pretensa indignação contra a inofensiva e ínfima seita dos amaldiçoados da droga (inofensiva porque ínfima e porque sempre uma exceção), essa minoria de amaldiçoados em espírito, alma e doença. Ah! Como o cordão umbilical da moralidade está bem atado neles! Desde a salda do ventre materno - não é? - jamais pecaram. São apóstolos, descendentes de sacerdotes: só falta saber como se abastecem da sua indignação, quanto levam nessa, o que ganham com isso. E, de qualquer forma, essa não é a questão. Na verdade, o furor contra o tóxico e as estúpidas leis que vêm daí:


1º É inoperante contra a necessidade do tóxico que, saciada ou insaciada, é inata à alma e induziria a gestos decididamente anti-sociais mesmo se o tóxico não existisse.


2º Exaspera a necessidade social do tóxico e o transforma em vício secreto.


3º Agrava a doença real e esta é a verdadeira questão, o nó vital, o ponto crucial: Desgraçadamente para a doença, a medicina existe.


Todas as leis, todas as restrições, todas as campanhas contra os estupefacientes somente conseguirão subtrair a todos os necessitados da dor humana, que têm direitos imprescritíveis no plano social, o lenitivo dos seus sofrimentos, um alimento que para eles é mais maravilhoso que o pão, e o meio, enfim, de reingressar na vida. Antes a peste que a morfina, uiva a medicina oficial; antes o inferno que a vida. Só imbecis como J. P. Liausu (que além disso é um monstrengo ignorante)* para querer que os doentes se macerem na sua doença. E é aqui que a canalhice do personagem abre o jogo e diz a que vem: em nome, pretende ele, do bem coletivo. Suicidem-se, desesperados, e vocês, torturados de corpo e alma, percam a esperança. Não há mais salvação no mundo. O mundo vive dos seus matadouros. E vocês, loucos lúcidos, sifilíticos, cancerosos, meningíticos crônicos, vocês são incompreendidos. Há um ponto em vocês que médico algum jamais entenderá e é este ponto, a meu ver, que os salva e torna augustos, puros e maravilhosos: vocês estão além da vida, seus males são desconhecidos pelo homem comum, vocês ultrapassaram o plano da normalidade e daí a severidade demonstrada pelos homens, vocês envenenam sua tranqüilidade, corroem sua estabilidade. Suas dores irreprimíveis são, em essência, impossíveis de serem enquadradas em qualquer estado conhecido, indescritíveis com palavras. Suas dores repetidas e fugidias, dores insolúveis, dores fora do pensamento, dores que não estão no corpo nem na alma mas que têm a ver com ambos.


E eu, que participo dessas dores, pergunto, quem ousaria dosar nosso calmante? Em nome de que clareza superior, almas nossas, nós que estamos na verdadeira raiz da clareza e do conhecimento? E isso, pela nossa postura, pela nossa insistência em sofrer. Nós, a quem a dor fez viajar por nossas almas em busca de um lugar mais tranqüilo ao qual pudéssemos nos agarrar, em busca da estabilidade no sofrimento como os outros no bem-estar.


Não somos loucos, somos médicos maravilhosos, conhecemos a dosagem da alma, da sensibilidade, da medula, do pensamento. Que nos deixem em paz, que deixem os doentes em paz, nada pedimos aos homens, só queremos o alívio das nossas dores. Avaliamos nossas vidas, sabemos que elas admitem restrições da parte dos demais e, principalmente, da nossa parte. Sabemos a que concessões, a que renúncias a nós mesmos, a que paralisias da sutileza nosso mal nos obriga a cada dia. Por enquanto, não nos suicidaremos. Esperando que nos deixem em paz.




* J.P. Liausu: intelectual conservador que chefiou uma campanha anti-cocaína na época.




Texto de Antonin Artaud

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Borges e eu


Borges e eu


"Ao outro, a Borges, é que acontecem as coisas. Eu caminho por Buenos Aires e demoro-me, talvez já mecanicamente, na contemplação do arco de um saguão e da cancela; de Borges tenho notícias pelo correio e vejo o seu nome num trio de professores ou num dicionário biográfico. Agra­dam-me os relógios de areia, os mapas, a tipografia do século XVIII, as etimologias, o sabor do café e a prosa de Stevenson; o outro comunga dessas preferências, mas de um modo vaidoso que as converte em atribu­tos de um actor. Seria exagerado afirmar que a nossa relação é hostil; eu vivo, eu deixo-me viver, para que Borges possa urdir a sua literatura, e essa literatura justifica-me. Não me custa confessar que conseguiu certas páginas válidas, mas essas páginas não me podem salvar, talvez porque o bom já não seja de alguém, nem sequer do outro, mas da linguagem ou da tradição. Quanto ao mais, estou destinado a perder-me definitivamen­te, e só algum instante de mim poderá sobreviver no outro. Pouco a pouco vou-lhe cedendo tudo, ainda que me conste o seu perverso hábito de falsificar e magnificar. Espinosa entendeu que todas as coisas querem perseverar no seu ser; a pedra eternamente quer ser pedra, e o tigre um tigre. Eu hei-de ficar em Borges, não em mim (se é que sou alguém), mas reconheço-me menos nos seus livros do que em muitos outros ou no laborioso toque de uma viola. Há anos tratei de me livrar dele e passei das mitologias do arrabalde aos jogos com o tempo e com o infinito, mas esses jogos agora são de Borges e terei de imaginar outras coisas. Assim, a minha vida é uma fuga e tudo perco, tudo é do esquecimento ou do outro.

Não sei qual dos dois escreve esta página."

Jorge Luis Borges





marcus.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Um pintor nos prometeu um quadro.

Agora, em New England, sei que morreu. Senti, como outras vezes, a tristeza de compreender que somos como um sonho. Pensei no homem e nos quadros perdidos. (Só os deuses podem prometer, porque são imortais.) Pensei no lugar prefixado que a tela não ocupará. Pensei depois: se estivesse aí, seria com o tempo uma coisa mais, uma coisa, uma das vaidades ou hábitos da casa; agora é ilimitada, incessante, capaz de qualquer forma e qualquer cor e a ninguém vinculada. Existe de algum modo. Viverá e crescerá como uma música e estará comigo até o fim. Obrigado Jorge Larco.

(Também os homens podem prometer, porque na promessa há algo imortal.)

Jorge Luis Borges.



marcus.



Carta sobre o pensar embriagado: irracionalizar

A voz anterior acorda o corpo para sentir, e já pensando concebe-se mais uma vez o vigor de um espírito em mais um dia enlouquecedor, surgindo à possibilidade de uma permissão à luz de adentrar o “recipiente” lançando força as cores; do ambiente enquanto corpo, espaço, janela de algo mais além da própria estética, do que se apercebe.

Num lugar onde Nada existe a criação consiste em trocadilho de realidade e ilusão - eis essa Luz, difundindo estes dois saberes (realidade e ilusão) em dúplice como conseqüência de reflexões; provocam confusão, são “irracionais” e reais, “extra-lúcidos” pela peculiaridade da desenvoltura individual, e sobrenatural por uma visão matura. Como os sonhos, esse “lugar de inexistências” e fluxos irracionais é uma instancia em mistura paralela de idéias sobre onde realmente se vive e para quê se vive; vendo coisas que não há (sentido). Sentindo onde não se estar, devaneando numa embriagues da vontade de entorpecer o sentido das coisas. Eles, os pensamentos a fundo, provocam uma inteligência-monolito na estúpida existência, em saber confundir, envergar a dita substancialidade - para não dizê-la Realidade, e, sobretudo ainda nisso esquivar todo entendimento racional deixando senão a memória do que foi sentido, como os sonhos revividos da lembrança no lado racional da existência... Eis a virtude da imaginação para todo aquele que irracionaliza: romper, dilacerar, achando por resolver assim a razão precária dos corpos sem luz, e sem nada de fato pretender, sistematizar, teorizar. É apenas “achando” que se pode envergar (a mente), num ato de alto preço que é tornar o outro um ser impermeável, pois os pensamentos do discurso interior embriagado e suas conclusões, são energias de valores intrinsecamente inigualáveis, é a digital da subjetividade individual dificilmente apreendida em discursos. Esse irracionalizar é um outro senso de enlouquecer, enquanto há o desejo da curiosidade de algo conhecer, algo novo e qualquer. Algo dentro da vida dentro de di, e por si “inexistente”... Ousadia! Pois sim, Corpos astutos e felizes são os que não procuram sempre ter as mãos somente o ideal e busca do prazer, degustando então naquilo que frustra, na tentativa do inatingível, outra composição e modelos novos de compreensão, desentendimento e aprofundamento da imaginação sobre as camadas protegidas aos olhos... Superficialmente protegidas, caro leitor. Superficialmente ilusão.

R

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Quanto ao outro

Quanto do ser está para outro, honestamente como absorção de uma outra imagem interior Distinta a si? Como uma “situação em conjunto”, o exacerbado auto-referencial que é detido único e arrogantemente no desejo de uma “extensão pessoal” em complemento de vontades próprias, poderá vingar uma relação de troca lúcida e saudável nessa “atuação mercenária” de egos a qual flutuamos?
Somente no conceito da auto-superação; na capacidade de fugir o espírito do corpo, o espírito, da estética – entendendo espírito aqui como momento superior da interpretação*; que se desloca de sua excessiva centralidade referencial, podendo assim observar o outro pelo estado de uma lucidez em um passo a frente de imparcialidade, pondo abaixo uma cadeia de julgamentos desnecessários. Desnecessário sim, pois, o que falta em si que faz com que esse outro incomode? O incomodo já é um estado de irritabilidade no ser. O ser em superação procurará entender seus vazios, ou buracos, e mesmo sem nada entender, contornar eventos, sendo ele o próprio autor de seus curativos, sem esperar, ou cobrar justificando no outro suas inquietações interiores, inquietações de elaborações do espírito* fragilizadas, abaladas, aos mofos até. Este é o “homem em vigília”, que se embriaga, e se contradiz, contendo e reformulando em si, cuspindo ao mundo por ferramentas das manifestações emotivas - se artista, seus traumas e ressentimentos, sem dar extrema relevância as conjecturas alheias possíveis às interpretações conseguintes de sua performance enquanto existente espírito de lucidez; sendo este aquele que busca a clareza de seu entendimento, estendendo sua chama em qualquer túnel sem luz. O ser em superação vai além de seus incômodos buscando Luz verdadeira, na luz dos céus, ou dos espíritos afins; seu real lugar de estar, "dobrando" sua náusea, "irritando-se" sobre um excessivo embelezar natural. A superior interação e possível real lúcida interpretação-limpa da situação em conjunto constatar-se-á na vontade do homem em si, romper de seu corpo tal espírito*, rebaixando o eu-narciso, tornando-se lucidamente seguro em ver o outro, num além dos seus sentidos que fará dos olhos e ouvidos uma integridade superior da absorção; unicamente Desejo. Configurando o outro então como “ser distinto”. Chegando a um outro estado de realidade, em uma igualdade de espírito em comunhão onde não há necessidade de mudar outrem, evitando-se assim a defasada embriagues de presumir seu auto-referencial um paradigma. A vontade de repetir-se e continuar no outro é estado de tolice. Tudo isso na ordem da “relação de identidade”, relação de natureza, relação em conjunto, situação social, observação dos espaços; numa sala de estar, cafeteria ou bar. Mais que isso é clínica.

R















Na foto: A beleza no Dark

sexta-feira, 6 de junho de 2008

O ser humano vivo é o ser da solidão... Mesmo a exemplo da comunhão, à interação substancial não totaliza uma intensidade que existe em si quando expressamo-nos por ferramentas da “manifestação” emotiva que dispomos. Para tal eu digo apenas que NÃO... O sexo, a falácia, a arte, a escrita, manifestações mutua de intensidades imanentes, jamais serão coerente nas relações ao nível de energia que cada ser em si se apercebe sobre suas emoções, seus desejos, em suas limitações. Talvez por isso que se traia. Coerentemente se traia ao preço de uma busca e constructo fruto da existência interativa, ou por minhas próprias palavras: o ato da “afetuose circular”. O mínimo de empatia no homem é a ponta contraditória dessa negação, o aspecto otimista. Algo muito saudável que viabiliza interagir dando margem e possibilidade à incompreensão, que gera insatisfação, angustia, e novas manifestações; quando assim se tem força e não se adoece. Este viés de Solidão está na visão e silencio de cada olho voltado ao mundo, cada eu em si, como depositante de energias a coisas vigentes: na força do agir mais simples até seu ápice conotativo. O ato de negação à inata absoluta “incompletude” dessa afetuose circular afirma a existência doentia e fragilizada dessa “Solidão inautentica”, onde o ser em seu isolamento necessita do espelho, seja o objeto ou o outro, apenas como vislumbre de suas “superfícies” em cegueira a seus destroços inutilizados pela força das imposições padrão circunspecta ao seu meio em toda uma existência idealizada sobre o princípio da busca do constante prazer aos moldes de uma estagnação do "real espírito de valor": aquele que sangra constantemente, e prossegue, supera-se. É preciso se perceber e saber “solidar” em conflitos com as frustrações ante os "objetos energizados", para assim organizá-los, ou seja, aquilo que se foi depositado nessa afetuose circular ser então maleável. E como premissa não se deve esquivar da relação sujeito e tempo, somos sujeito do/para o tempo, somos "parto eterno". Assim ocorre as mudanças das causas afetadas, afetivas, subjetivadas, insidiosas, como superação do já corpo-dejecto desse homem, jogando-se para fora no tempo e observando os espaços, na prática do seu inverso, de seu sentido contraditório.

Na fotografia: o ato do sujeito da Solidão vivo, num momento de afetuose circular.




















R

terça-feira, 20 de maio de 2008

O Poema e a Água

As vozes líquidas do poema
convidam ao crime
ao revólver.

Falam para mim de ilhas
que mesmo os sonhos
não alcançam.

O livro aberto nos joelhos
o vento nos cabelos
olho o mar.

Os acontecimentos de água
põem-se a se repetir
na memória.

(Poema do livro "Pedra do Sono", João Cabral de Melo Neto)



As imagens criadas por Cabral, numa eterna meta-poesia, me fazem tê-lo como o poeta.

marcus.
"Talvez a velhice e o
medo me enganem,
mas suspeito que a espécie
humana - a única -
está em vias de extinção
e que a Biblioteca
perdurará: iluminada,
solitária, infinita,
perfeitamente imóvel,
armada de volumes
preciosos, inútil,
incorruptível, secreta."

(Trecho do conto "A Biblioteca de Babel", Jorge Luis Borges)






marcus.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Geminado ao Nada

Na genealogia da incompreensão

Os pensamentos - ou talvez descobrimentos - que correm no corpo que anda, sumindo e evaporando junto ao tempo que se desmancha, adormecendo calado junto ao ser incorrido ao nada, são por “gene próprio” acometidos de uma beleza sábia. Se então contemplativo por natureza e advindo de um “caminhar” - ato, ou no sentido figurado de continuar-, onde caberá na existência esse “ser paixão”, ou paixões, que espiritualizadas ou não, uma vez refutadas refletidas em si são “suicidadas” ao vão? Elas são e cabem, mesmo que fúnebres, dissimuladas, desordenadas e incompreendidas - como talvez, ou “quase” aqui - no “tamanho” de um olho, ou olhar, ausentes de compreensão. Como nesse silêncio que se segue...


R

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Trigêmeos (Ansiedade, ócio, e o ópio)

Música: Molto Vivace, Symphony No. 9 "Choral". / Ludwig van Beethoven

Ansiedade, ócio (e o ópio)... Há quem fale por puro empirismo, há quem interprete por auto-omissão, não abertura e pessimismo, onde a platéia se faz palco (oblíquo)... A vida -energia- depositada e nascente nos momentos sublimes é um único show descontinuo.

(Trigêmeos,) “Casados” e entrelaçados, na busca pelo conforto, no desconforto, do corpo (do altar), ou no estar como um estorvo é o quê, se não inquietude, juventude, e prazer?, Em descobrir-se (das “couraças” sociais), destruir-se (entre as demais facetas incondicionais do ser em), implodir-se de seu vácuo interior não satisfeito... ?

O homem não satisfeito dará sempre um movimento a mais de si além numa ruptura entre o que ser de destruição, intuição, ou até nova inocência... Toda destruição ou construção dum saber dar-se-á na não permanência; Vingue-se o ato! Abertura ao devir... Vamos, seres humanos, prolongar-se e demolir numa instancia unificada que seja fruto do ócio, inquietude da ansiedade como um “toque de existência”, pois na tragédia desse ocaso imanente pode estar o novo salutar (ou, o novo ópio).


Com um pé no parâmetro da possibilidade do reducionismo e seu mal-estar como um sintoma humano, eis aqui, uma fala...

D
Música: Blue Danube / Johann Strauss 2001 - A Space Odyssey soundtrack

Créditos

Confundo o ser e a realidade.
Distorço o que sou e o novo.
Desvio-me do dever para o belo.
Envolvo-me com o pouco que
permaneço na intensidade do eterno.
Evito-te, quando em ti me reflito.
Sou antes a fala um conflito;
entre o desejo de me declarar
e a ânsia pelo sumiço.
Calado, sou o ilibado,
Falante, sou ilícito,
O corte entre o atroz e o medíocre
na fusão entre o vazio e o que incide.
Meu âmago é uma valsa constante
em ressonância num recipiente profundo.
No escuro me habita um mutante
que confunde o desejo de estar
com a necessidade do mundo.
Vejo tudo como está na iminência de um
moribundo, que acorda forçado a constar,
desejando implodir-se de tudo.
Quando lúcido ludibrio o amar,
embriagado sou teu e de tudo onde há
no consolo de acalmar as dores
e rancores deste corpo transparente
inconstante e lúdico.

G