"Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero."
Antonin Artaud

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

sobre cabral e os cogumelos

Antiode (contra a poesia dita profunda)


Poesia, te escrevia:
flor! conhecendo
que és fezes. (Fezes
como qualquer,

gerando cogumelos
raros, frágeis, cogu-
melos) no úmido
calor de nossa boca.

Delicado, escrevia:
flor! (Cogumelos
serão flor? Espécie
estranha, espécie

extinta de flor, flor
não de todo flor,
mas flor, bolha
aberta no maduro).

Delicado, evitava
o estrume do poema,
seu caule, seu ovário,
suas intestinações.

Esperava as puras,
transparentes florações,
nascidas do ar, no ar,
como as brisas.




João Cabral de Melo Neto

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