segunda-feira, 16 de julho de 2007
Outros Pessoas
Os outros Pessoas
Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos
O LUAR ATRAVÉS DOS ALTOS RAMOS
O luar através dos altos ramos,
Dizem os poetas todos que ele é mais
Que o luar através dos altos ramos.
Mas para mim, que não sei o que penso,
O que o luar através dos altos ramos
É, além de ser
O luar através dos altos ramos,
É não ser mais
Que o luar através dos altos ramos.
(Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos, 1911-12)
POUCO ME IMPORTA
Pouco me importa.
Pouco me importa o quê? Não sei: pouco me
[ importa.
24/10/1917
(Alberto Caeiro, Poemas Inconjuntos, 1913-15)
NADA FICA DE NADA
Nada fica de nada. Nada somos.
Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos
Da irrespirável treva que nos pese
Da humilde terra imposta,
Cadáveres adiados que procriam.
Leis feitas, estátuas vistas, odes findas —
Tudo tem cova sua. Se nós, carnes
A que um íntimo sol dá sangue, temos
Poente, por que não elas?
Somos contos contando contos, nada.
14/02/1933
(Odes de Ricardo Reis)
CRUZ NA PORTA DA TABACARIA
Cruz na porta da tabacaria!
Quem morreu? O próprio Alves? Dou
Ao diabo o bem-'star que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.
Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou
Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.
Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou.
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.
Meu coração tem pouca alegria,
E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!
Desde ontem a cidade mudou.
Mas ao menos a ele alguém o via,
Ele era fixo, eu, o que vou,
Se morrer, não falto, e ninguém diria:
Desde ontem a cidade mudou.
(Poesias de Álvaro de Campos)
- Marcus
(foto: Gaião)
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Um comentário:
1. A foto tá ótima! 2. Nunca me cansa ler o amigo Pessoa, um poeta por completo. "Somos contos contando contos" ...tem mais o que dizer?
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