"Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer uma das causas do desespero humano, não teremos o direito de tentar a supressão dos meios pelos quais o homem tenta se livrar do desespero."
Antonin Artaud

terça-feira, 11 de dezembro de 2007



Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.




Composição: Carlos Drummond de Andrade









achei que esse poema tá bem "no momento" que estamos vivendo...

e vem durando bastante...



"a gente não pode esquecer". "não me deixem esquecer que a gente nao pode esquecer".







marcus.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A Título De Nada

Em branco. Eu solicito uma folha em branco, um dia em branco, por minhas mãos pintá-lo, por meio de emoções “minhas”, e vontade, o desejo. Não nasci para me manter sem paixão, não nasci apenas para comprar o pão. Sim, eu sou um ralo, minha vida corre rio abaixo, no asfalto, nos segundos. Mas deixe que faço de mim mesmo um ralo, não deixando tornar-se por obra do asfalto nem dos constructos recíprocos. O que serei será do vento, o que digo “o ser” de maior importância. Porem, a agitação que motiva as idas e vindas, arremessa o corpo a exorcizar energias, e eis uma lógica. Descobrir-se como músculos então, a sentir sua composição, o suor, a força, a prática, a adaptação são adventos a serem buscados numa difusão ainda em, mais e mais conotações. Os ciclos das energias que existem, são freqüências de fontes indiferentes, o dizer que fecha a interpretação de suas experiências não deve compor grande significância. Sobre o outro, outra absorção, e coisas das quais não se falarão, sem consenso. Milhões de palavras se aplicam a milhões de momentos. Estas escrevo, e estas não são minhas por exemplo, por exemplo.

A obra de Iman Maleki

Olhar.
porque:
Apenas olhar (!) não se concebe;


- Há vida dentro e fora. (O abstrato)
- Não há vida. (A lógica)
- Não é morto.
(O abstrato)
- Nem está vivo. (A lógica)
- É uma Pintura. (O abstrato)
- Não somente.
(A lógica)

terça-feira, 4 de dezembro de 2007


dentro de uma janela
me sinto querer uma varanda

mas dentre uma cortina e uma meia
me sinto querer uma cama

ou quem sabe o chão..






marcus


Foto: Penélope Cruz

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

beatles careta



quando o olho busca mais uma nota musical
uma nota que demonstre aqueles tons agudos de intensidade viva
ele acha um careta

ah, se fosse um careta daqueles que se põe fogo na ponta e se traga
que se tira fumaça e nicotina
seria ótimo..

mas é apenas um cara e uma garota careta
daqueles que passam a vida e não descobrem sequer que estão vivos
ou que podem estar se quiserem

caretas..
caretas...
que pena tenho desses caretas

há quem queira mudar o futuro do mundo
ou a vida dos alheios.. nao nao

agora, enquanto penso sobre ter pena,
me toco que na verdade o que sinto é indiferença

indiferença é um sentimento tão forte, não é?
parece que se olha de cima pra baixo..

mas não... só olho um ser dotado de energias e calor pra se descobrir
e descobrir o mundo, as cores, o vento, o tudo que paira por ai
e ele apenas desperdiça..

mas também porquê não desperdiçar né?
quem disse que temos que aproveitar tudo tudo?
hã?

acho que o segredo é descobrir nossos semelhantes e nos unirmos à eles
juntar as forças dos que adoram descobrir
dos que adoram viver e aprender

aprender seja o que for,
aprender a desaprender. a ser careta. a nascer outra vez
e outra vez..

eu já nasci tantas outras vezes que nem sei mais
nem sei mais que diferença faz
nascer e morrer outra vez

[texto sem métrica. nem sentido]
não fui eu que escrevi.




marcus

terça-feira, 27 de novembro de 2007




joão de castro e suas belas formas..
"suas" porquê a beleza da forma tá em quem a enxerga, em quem olha.. e isso ele sabe.. olhar e captar, deixando com que nós também apreciemos tal beleza..

preto no branco,
preto no belo,
belo no branco.

mais um ode a fotografia,
do corpo,
um ode ao corpo.

o corpo só é belo porquê há algo muito vivo dentro,
quando é vazio se torna plástico, e pra plástico não existe beleza.
o corpo só é belo quando há algo bem muito vivo fora,
quando é vazio, perde, cai, frouxa..

e quando se tem beleza dentro e fora...
aí eu chamo de arte.






marcus T.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

pro poste ai em baixo

um poste

é a pulga de um pôr-do-sol
é a espinha de uma fotografia
é o que me lembra que no mundo existe
. gente que suja
. gente que consome
. gente que gasta
. e que come

eu como
mas não como o mundo

eu sujo, mas sujo a mim mesmo

o poste suja a vista
suja a casa, liga a televisão
e desliga a visão
só fica a tele

suja
tela suja

o poste
aposto
que não gosto





marcus T.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

relato do êxtase

o primeiro passo pra encontrar seja o que for além dos limites entre você e todo o mais é encontrar a si próprio.
se encontrar ali, na frente de um sol que nasce púrpuro, contemplando-o sentado numa areia que de tão confortável faz desnecessário qualquer cama ou sofá.
descobrir que tem-se pele, e que essa é macia como um broto de algodão.
aprender a espreguiçar-se e a tocar o outro.

quem precisa de espelho precisa de palavras.
ao esquecer a existência de um objeto chamado espelho encontramo-nos mais do que podiamos imaginar, ao ponto de estabelecer comunicação sem qualquer palavra durante horas; ou quem sabe, dias.
seja ao desviar-se um olhar ou ao coçar o nariz, ou até ao soltar um sorriso ínfimo, posso dizer muito mais do que se diz "falando" ou "escrevendo".
as perguntas e respostas são sentidas, percebidas, notadas; e não faladas.
as experiências são vividas e não relatadas.
as explicações nunca são completas. quem as escuta sempre tem uma grande defasagem no entendimento do "explicado".
é um grande problema achar que o verbo é a melhor forma de comunicação que concerne ao homem.
eu quero sentir até adormecer, até ter cãibras.
e quero sempre estar junto dos que sentem, aprendendo e ensinando esse verbo (mesmo sem chegar a verbalizá-lo) .



marcus T.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

o que resta além da tarde

Um sorriso contido num momento chave pode não determinar o que é o homem, porém ilustra suas intenções e traumas. Ao passo que um sorriso escorrido e solto pelas tardes grita o que há em seu âmago.
Entretanto, todo o entendimento depende de quem olha.
É no olho do observador que mora a beleza e a arte.

marcus T.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

descanso.

canso.


precisa-se eh de

acordar com um copo de água fria

na cara

pra dar ânimo de funcionar plenamente.


parece que de tanto pensar em fazer,

já não se faz nada.

parece que de tanto pensar,

já nem se pensa mais.


já nem se faz mais.


houve uma época em que se fazia,

porém, não o pensava.

outra em que se pensava,

mas não o fazia.


agora faz-se sem pensar e pensa-se sem fazer.


só meu corpo está lá, quente, vivo, molhado.

mole, mexe.

mas eu, preocupado (em vão).

frio, frouxo.


quero mudar de casca mais uma vez.

mudar de casa, mudar de mala.

essa mutação me mata,

mas é dela que eu vivo.






marcus T.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Orgia musical


Coming Back To Life
Pink Floyd

Composição: David Gilmour

Where were you when I was burned and broken
While the days slipped by from my window watching
Where were you when I was hurt and I was helpless
Because the things you say and the things you do surround me
While you were hanging yourself on someone else's words
Dying to believe in what you heard
I was staring straight into the shining sun

Lost in thought and lost in time
While the seeds of life and the seeds of change were planted
Outside the rain fell dark and slow
While I pondered on this dangerous but irresistible pastime
I took a heavenly ride through our silence
I knew the moment had arrived
For killing the past and coming back to life

I took a heavenly ride through our silence
I knew the waiting had begun
And headed straight...into the shining sun

- Essa composição é sem dúvida, para mim, um estágio de êxtase. David Gilmour compõe ápices de emoções musicais porque ele é uma melodia extrema, no pop, no som, na voz. Para mim ele é uma melodia. No mundo sonoro será eterna. Eu escutando essa música fazendo jus a seus sentidos, em mim cada rasgada melódica nos solos, ou tom de voz agudo, tudo, ruboriza, arrepia, porque é muita coisa! É muita emoção num curto espaço de tempo, numa música. Lindo, odes musicais ultimamente como nunca; in Rainbows, the piper at the gates of dawn, "coming back to life"... energias

Nude


Don't get any big ideas
They're not going to happen
You paint yourself white
And fill in the noise
But they'll be something missing

And now that you've found it- its gone
and now that you feel it- you don't
You've gone off the rails

So don't get any big ideas,
They're not going to happen

You'll go to hell for what your dirty mind is thinking



(In Rainbows - Nude)



marcus T.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Memórias inválidas

Enquanto você esteve tentando me apagar de suas entranhas, eu estive andando por ai.
Agora eu me tornei mais do que antes no espírito, visitei-me e encontrei um baú de destroços meus, fragmentados. Tomei o curso na direção interior da dimensão de minha busca, e antes do restante, a busca da minha sombra que me foge, -algo pra dizer do que rir de mim e eu nem sei o que é, sobre o que se trata. Eu o vejo agora sentado me olhando, eu nunca consigo entender suas feições, ele é bem mais rápido q
ue consigo imaginar, será ele minha ilusão favorita para representar as coisas que me envergonho, ou que finjo entender para não me sentir mais real? Sei lá, a maior parte me diz que ele é alguém que me encontrou no meio do nada, quando num nada estava eu a sua procura, nesse nada habitam outros vários e todos nunca estão desocupados. “Vagar é a tarefa mais árdua” diz ele. Ele me entende somente quando eu não o percebo, ele diz que meu eu natural é uma excelente atuação sobre a vida, mas seus dizeres são sempre vacilantes validando para este lado de cá, já que lá a razão é um artefato abstrato que se manuseia mais facilmente sobre as questões, ele diz que não entende o por que de eu nunca levá-lo tão a sério se o reflexo nos seus dizeres estão na representação dos outros sobre mim, e que ele é mais uma das sementes que cai de uma certa frutífera árvore. Ele é bem esperto, quando estou com dor de cabeça é por tanto lhe falar algum tempo. Vivendo e planejando eu acabo mesmo esquecendo passos atrás. Talvez eu já tenho pensado profundamente sobre a projeção que sou hoje de um olhar ainda presente num passado não distante. Muito passou, talvez eu nem tenha pensado, aqui estou escrevendo memórias, memórias inválidas de minha pessoa já fora do prazo.

5p0ck

nada parecido
como essa imagem atemporal -salvador dalí

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

alma branca, café preto.

- Qual é a sua relação com o café? Muito ou pouco adocicado?
Me parece que as relações que mantemos com o que chamamos hábitos cotidianos podem refletir diretamente uma espessa faceta de nossa personalidade.
Se eu gosto de tomar café numa xícara grande e cheia, com muito açúcar (até ficar cerca de um dedo precipitado no fundo, mesmo depois de mexido) isso de alguma maneira significa que posso ser uma pessoa compulsiva, desmedida e exagerada em outros âmbitos de minha personalidade que não o café? Sim, pode ser (ou não, né!?)
E se, porventura, gosto de café preto e amargo, em xícara pequena ou "dois dedinhos" num copo de bar, será que sou mais sensato? Será que porquê escuto Chico Buarque sou culto? E porquê assisto filmes franceses sou Cult?
Julgamentos (ou pré-julgamentos) são sempre uma bosta.
Mas hei de perguntar a mim mesmo: se vejo uma garota ali na frente, dançando em pequenos movimentos, num trocar de passos que é fruto de um momento de "sinceridade corporal" consigo própria, junto aos seus semelhantes e chegados, será que essa imagem pode ser considerada espelho de sua personalidade, mesmo que que o observador não a conheça? Ou se observo um cara (que acabo de conhecer) brigar com sua namorada pelo telefone durante 40 minutos só porquê a garota diz que vai sair com as amigas, será que posso taxá-lo de "imbecil". Acho que posso. Pois só um imbecil quer ter uma namorada que obedece só à ele. E só uma garota com uma alma branca pode dançar daquela maneira (as de almas mais escuras dançam com mais hostilidade, ou com mais tristeza, seja na expressão corporal ou facial).
Mas, se me perguntas, "o que é alma branca?". Não respondo-te nada, não agora.

marcus T.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Postagem - Thom Yorke (In Rainbows)

"Wed, 10 October
hard hats on..


hope you are enjoying listening to the download of In Rainbows.
its a relief to us all that finally its out there.
its been a mad couple of weeks.. as i'm sure you can imagine...

"I love pop music to death..... Most great composers rely on folk music. I rely on pop music.
I'm not saying I'm a great composer or that pop music is folk music. There's a whole endless thing going on out there.
You make your little pond but if your pond isn't connected to the river, which isn't connected to an ocean,
it's just going to dry up. It's just a little piss pool. I've lived too long to be happy in a pond."

I found this in WIRE magazine over a pint in the pub last night.. its Robert Wyatt


Thom "
Fragmento de texto trazido do blog radiohead.com, com escrito de Thom sobre o lançamento do novo CD, In Rainbows.
Escuto seguidamente desde que tive acesso ao CD (quinta-feira passada) e não consigo parar de colocá-lo pra tocar no som. É viciante. Tá na sala, no quarto, no carro, na casa do amigo e na reunião do pessoal. Me impressiono com a "fluência" das músicas; o ritmo e a cadência parecem vir prontos para entrar nos ouvidos e a partir daí mexer com todo meu ser, com o que sinto, com o que penso. É ótimo pra dormir e maravilhoso pra acordar. Está por marcar esses meus dias.
Há muito que não me sentia tão bem por conta de um conjunto de 10 músicas compiladas num álbum.
Obrigado, Thom.

Marcus T.



"You make your little pond but if your pond isn't connected to the river, which isn't connected to an ocean,
it's just going to dry up. It's just a little piss pool. I've lived too long to be happy in a pond."

- Pond: poça.
- Rely: Invoco.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

I´m A Cyborg, But That´s Ok




Espelhos sem você (outro)

Um cinegrafista da vida.
Um fotógrafo de todos os momentos
. - (uma câmera na cabeça).
Um receptor de sentidos.
Um cérebro-filtro.
Um filtro que não filtra.

Uma peneira fotográfica.
Uma peça perdida no meio de uma geração.

Um humano se descobrindo por descobrir nos outros o que não tem em si mesmo.
Um humano não-humano. Um cyborg?

Um guardador de realidades,
tantas, tão diversas e difusas
que nem cabem no conceito
. de "realidade".

Um sonho, um sonho vivo.
Um sonho acordado.
Um sonho da vida e uma vida de sonho.

Um eterno hoje, um amanhã inexistente.
Um trago, um gole, um copo.
Um amigo.
Uma vida.

Definitivamente, uma não-poesia.

Antagônico.
Errado.
Esquerdo.

Um dedo,
no olho,
do espelho.

Um furo,
na consciência,
do mundo.

Um pulo,
no peito,
de mim mesmo.

Um susto,
um fragmento
de um momento

e,
de novo,
uma vida.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Espelhos sem você

As pessoas evocam e ostentam realidade (limitam-se!) cada vez mais, eu já não me sinto bem com isto, de tanto escutá-la, de conceber sua flexibilidade, e ver sua rigidez disseminada, comecei a construir deflexões de um parâmetro que já assim me faz num mínimo sentir-se distante de um contexto narcisista e propagador, podendo o observar e sentir sua negatividade e assim poder se ajustar numa sensação de transparência. Hoje, eu sou compulsivamente discreto, um pouco mais do limite, porem foi onde descobri um aliado no poder da observação. Eu não sou sério, eu observo!

5p0ck

domingo, 7 de outubro de 2007

Estou Chapado

Eu estou numa posição quando deveria estar noutra.
Eu sou um quando deveria ser outro.
Eu deveria está chorando e estou sorrido!
Minhas lágrimas são tão raras que quando choro me aflora algo que me orgulha.

Tolice! Minhas vibrações de tão profundas serem me estremece o corpo às veze
Corpo este que não cabe ao espírito,#@¨#¨%$*¨(*

Estou chapado! Comendo o Melhor bolo! Comendo a melhor música . Estou chapado de ter se sentido dentro do outro após sublimes diálogos. Estou chapado
do frio, do vento forte! Estou chapado digitando sem sentir os dedos. Estou chapado de pensar, de digitar, de se fuder! Pa puta que pario, caralho! Porra! Mas, Eu Estou chapado, né? Estou chapado de pensar em mim, estou chapado de viver assim, quero andar no campo sentir o mato, sentar num capim, esquecendo uns certos saberes e sentidos atribuídos, principalmente do imaginar saber o que é chapado ou qualquer coisa resto! Estou chapado com tudo, esse tudo soa mais como “um belo” começo, ainda. Eu sou precoce, projeto de prognósticos como dejetos ou arquétipos, chapados. Por toda vida fumados!

...é o caralho mermao!

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

We Suck Young Blood



are you hungry?
are you sick?
are you begging for a break?

are you sweet?
are you fresh?
are you strung up by the wrists?

we want the young blood

are you fracturing?
are you torn at the seams?
would you do anything?
flea-bitten? motheaten?

we suck young blood
we suck young blood

won't let the creeping ivy
won't let the nervous bury me
our veins are thin
our rivers poisoned

we want the sweet meats
we want the young blood



(Texto: "We Suck Young Blood", Thom Yorke - Hail To The Thief - Radiohead)
(Imagem: José Mikosz - Ilusão da Infância)

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

O relógio não cabe no poema

Não há vagas

O preço do feijão
não cabe no poema.

O preço
do arroz
não cabe no poema.
Nao cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em seus arquivos.

Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras.

- porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede nem cheira.

Ferreira Gullar

sábado, 29 de setembro de 2007

il; Sua Tragédia de ser

Encontrou-se uma tristeza que não cabe ao corpo. “O meu amor está chorando”. Construíram-se notas musicais para impregnar uma passagem ao som que se possa de alguma forma conceituar da maneira, mais simples ou ridícula (que seja), sobre emoção, para quando assim perceber, se tocar (ao som) de que tudo aquilo passou. A maldade que emerge do humano é unidade gigantesca, é o mal próprio, nada mais o é, e soa como se fosse pouco. Você não chora porque mesmo as lágrimas secam, e não se pode. Você engole porque quando você pensa em matar você torna-se você ao avesso, e ai é um você que não se sustenta sobre si, -as pernas cambaleiam como nunca. Você não tem auxilio exterior algum porque tuas conotações sobre resolução perpassam uma rota que o trilho mudou, você é contraste aberração. Você não age porque você é omisso, e ao mesmo tempo você vê que sua felicidade é o sangue do outro, a partir do momento que você mingua, mingua em um mínimo triplo. Você é semente ensangüentada, grito de sofrimento, nascido de uma angustia que não aliviará jamais. Você volta para o mundo teus sentimentos hostis, ou amor, porque você se julga catalisador de emoções; e é aquele que cospe situações na propriedade da promiscuidade projetando um covarde que antecede cada emoção posterior. Teu reflexo é a freta entre tuas dimensões e caras corruptas, todas elas, é o álibi de uma unidade existencial recíproca, a unidade de sorrir ao espelho.

Trajeriano dr

another one dreaming

Era uma festa litorânea, com uma movimentação intensa, e bem sei que são das lembranças e estética compostas por uma certa curva deste continente referente a um lugar de Tamandaré . Era Tudo totalmente fosco e confuso; era uma festa, tinha um barco, posteriormente alguns arqueiros que fizeram lançar-me ao mar. Antes, me recordo de um outro cenário, e ao mesmo tempo a sensação posterior que construí foi que sonhei duplo e simultaneamente, não seqüencialmente. Durante a festa litorânea, um pensamento me apertava, o de ter certeza que um carro certamente já tinha sido inserido no andar de minha casa, então eu estava no litoral e dentro da minha casa nesse pensamento que projetei dentro do sonho. Minha casa é comprida, e lá estava Xuxa, que era alguém que me apresentava uma dinâmica e eu atentava cuidadosamente. Como de praxe nas aulas que compõe minha ocupação acadêmica, a maioria dos que lecionam são do sexo feminino, e assim explica-se um pouco desse fato estapafúrdio. Eu brigava comigo mesmo para entender como um carro ali se encontrou, no interior da minha própria casa (refletindo com a mão no queixo). E seguindo uma idéia da composta no texto “Un rêve” , essa divergência seria o álibi que compõe meus paradoxos reflexivos em conflitar as questões mesmo as que ali estão, calmas e imóveis. Quando me dei conta de que aquele conflito opaco não passara de mais uma conflitiva imóvel, eu voltei e me foquei a situação no mar, fugindo das flechas daqueles arqueiros invisíveis que atiravam às águas, daí então decidi prosseguir neste percurso com mais cor, era dia, eu propus a idéia de atravessar o oceano já que percebi que minha situação tratava-se de um idílio, desenvolvi uma proteção e fui coberto por palhas de bananeira em forma de cruz, o que tinha como significado maior me proteger da vida marinha. E assim pude me perceber agindo naquele instante; nadando, boiando, e logo avistando a próxima costa, que seria uma África de índios americanos (pela estética que na minha memória tem de índio). Essa costa lançava coqueiros altos da terra próxima ao mar de uma maneira que eles se postavam lindamente como a franja do litoral a sombrear o mar, eu admirei aquilo intensamente. Já na beira pude visualizar um caminho largo, onde a terra da planície dividia a selva adentro. Comecei a perceber as pessoas, a sobrevivência toda imposta pelas condições da selva, as crianças e as situações. As cobras eram muito presentes e o ato de andar às vezes só era possível com auxilio de algumas cordas pesadas (que conotei como correntes) de maneira que as chutando (e conseqüentemente se movendo) adiante simulasse o rastejar de uma mesma serpente. Os pássaros eram as olheiras, e todo conjunto de espécie ditava uma condição para ali se estar. Aqui, nesta parte eu me identifiquei muito no sonho quando se trata da relação humano/selvagens. A posição é justamente a oposta, com submissão aos reis (bichos) para uma suposta sobrevivência, a postura me encanta muito, porém assim não torna aquelas pessoas como humanos dos que faço parte. Perfeito. Eu me senti muito bem de ter construído este sonho tão belo, as pessoas que criei nem refletiam (no aspecto de lembrar, ou preocupar-se) com a submissão, que assim se tornava do meu viés. Minha posição foi de contraste, eu não poderia fazer dali meu habitat, tudo girava em torno de (e soava como) uma passagem bem rápida se relacionado ao percurso que tracei, e eu pensava, logo-logo sinto que este sonho vai dissolver-ser, o que tenho para fazer mais? O quê? O quê? E isto representa justamente os momentos que busco na introspecção coletiva que difundo com mais próximos. Logo quando me indaguei o cenário apagou as luzes.

Sonhos é meu paradigma sobre à auto-inserção no infinito, sendo ou não tudo que carreguei do passo anterior.

Puor “un rêve”.

domingo, 23 de setembro de 2007

Diário de Praia (João de Castro)



"Sonhar é uma dádiva sobre a matéria."

com que gosto ela virá?

Eu sei que determinada rua que eu já passei,
Não tornará a ouvir o som dos meus passos
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir
Cada vez que eu me despeço de uma pessoa
Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela ultima vez
A morte, surda, caminha ao meu lado
E eu não sei em que esquina ela vai me beijar

Com que rosto ela virá?
Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque
Na música que eu deixei para compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?
Virá antes de eu encontrar a mulher, a mulher que me foi destinada,
E que está em algum lugar me esperando
Embora eu ainda não a conheça?

Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida

Qual será a forma da minha morte?
Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida?
Existem tantas... um acidente de carro.
O coração que se recusa abater no próximo minuto
A anestesia mal aplicada.
A vida mal vivida, a ferida mal curada, a dor já envelhecida
O câncer já espalhado e ainda escondido, ou até, quem sabe
Um escorregão idiota, num dia de sol, a cabeça no meio-fio...

Oh morte, tu que es tão forte,
Que matas o gato, o rato e o homem
Vista-se com a tua mais bela roupa quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado e que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem
Nos meus filhos, na palavra rude
Que eu disse para alguém que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber aquela noite...



(Raul Seixas, Canto para minha morte)







Hoje eu escutei bastante o velho Raulzito. E quando ele falou isso que tá escrito aqui em cima eu coloquei pra escutar outra vez e outra vez..

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Un rêve


Um sonho tem a propriedade de colocar-nos em situações que podem refletir, com algum nível de ligação, o que vivemos e sentimos quando acordados. Essa última noite (do dia "não-importa-qual"), sonhei e lembrei-me do sonho assim que acordei (ou apenas não esqueci-o em momento algum). Na verdade, recordo-me de dois sonhos que tive durante essa noite citada, porém farei referência ao qual percebi mais fundo de significado e ligação com o awake-time (tempo-desperto).Descrever um sonho é uma tarefa um tanto impossível de ser feita plenamente, ao ponto de atingir o completo entendimento sobre quem lê a descrição. Porém, ouso a tentativa de usar breves explicações e referências ao sonhado, visando passar ao menos uma longínqua idéia do que me foi passado pela cabeça.Estava eu e mais algumas pessoas. Não muitas, embora mais que uma e não mais que três. O lugar onde estávamos era montanhoso, algo como um vale, entre morros e campos, onde o verde prevalecia. As imagens não me vêm muito claras, mas creio que era dia. Lembro-me bem que durante nossa caminhada campestre um ar de "algo vai acontecer agora, agora, ... agora..." pairava, porém nada ainda acontecia. Só a sensação da iminência de algum acontecimento, o qual esperávamos sem saber o qual. A recordação seguinte é a de uma enxurrada de água ter começado a jorrar pelas entranhas do vale, vindo sempre de encontro ao lugar que estávamos. O chão mais ao fundo (na parte mais baixa do vale) começava a se tornar um rio de água marrom, barrenta, pois era essa a cor da água (como água proveniente de chuvas violentas, porém não chovia). Tudo que nos importava nesse momento era subir. Subir para o topo do vale, escalar as paredes montanhosas do morro que estava à nossa frente, ir para longe da água que soava bastante perigosa. Mas quanto mais subíamos, distanciando-nos da água, mais água existia, e tinhamos que subir mais. Nesse momento faço uma breve pausa no andamento da descrição do cenário para falar sobre as pessoas das quais recordo-me a presença nesse momento. Minha mãe estava em algum lugar no sonho, embora eu não possa recordar exatamente onde (talvez em minha mente). Spock estava do outro lado do rio (o fundo do vale já havia se tornado um rio de água corrente e relativamente violenta). Entre eu e Spock havia uma forte correnteza que impedia-o de vir para o lado onde eu estava, que era o lado que eu acreditava que continha a única saída para "salvar-nos" da enxurrada crescente. E é nesse ponto que chego aonde pretendia quando comentei sobre o fato dos sonhos terem a faculdade de refletir o nosso estado desperto, digo refletir de alguma maneira não tão exata, maneira essa muitas vezes metafórica, se é que podemos denominá-la assim. Recordo-me vagamente de chamar "Venha velho (Spock), se jogue na água e venha pra o lado de cá enquanto é tempo, vamos! Senão a água vai lhe levar. Eu lhe ajudo! (dando a mão nesse momento)". E parece que ele queria vir, olhava pra mim buscando coragem ou algo do tipo para pular, mas ainda não vinha. E esse momento durou bastante, até que ele veio. Veio e nesse momento olhamos em direção à montanha para seguir em frente com a escalada para nos salvarmos da água que subia cada vez mais. Nesse momento em que pretendíamos continuar subindo o morro, uma parede que antes não havia lá, acabava de aparecer diante de nós, dificultando nossa escalada. Mas não desistiamos. Começamos a quebrar a parede com algum tipo de marreta que nos apareceu nas mãos. Ao tempo que quebrávamos a barreira, nos aparecia o lado de lá, com mais morro para ser escalado. E escalávamos, subíamos indo cada vez mais distante da água violenta e em busca de nosso objetivo que era simplesmente sair daquele lugar que se tornava demasiado perigoso. Sinto que o sonho continuou bastante após isso, mas agora não consigo lembrar-me mais como continuava. O que ficou de interessante pra mim foi o fato de sentir meu amigo o mesmo tempo perto e longe de mim. Como se estivéssemos fortemente ligados de alguma maneira, eu diria, mais "espiritual" do que física. Pois enquanto os dois queriam estar unidos para seguir a escalada, um não ia enquanto o outro não o acompanhasse. Nesse caso, eu não seguia caminhada enquanto Spock não atravessasse o rio para o lado que eu estava e acreditava conter a saída possível (e que alguma coisa me diz, realmente continha a saída). Outra coisa que ficou pairando sobre minhas buscas por significado real do sonho, foi o fato de eu chamar Spock pra vir e ele hesitar alguns momentos antes de atravessar. É um reflexo da minha personalidade agindo sobre a do meu amigo. Como se eu o chamasse para aderir a uma das minhas certezas (hum! certezas! quem me dera tê-las comigo.) e ele contrabalanceasse com as dele antes de chegar a "atravessar o rio" de fato. Nesse caso o rio é uma bela e enorme metáfora para as diferenças que nos fazem seres humanos diferentes uns dos outros, e também para mostrar que estamos sempre aprendendo com e aderindo às idéias dos outros, principalmente às dos amigos. Nesse caso Spock atravessou e veio para o lado onde eu habitava no momento, mas poderia muito bem eu ter ido para o lado onde ele estava. Talvez se o Spock tivesse sonhado sobre isso tivesse sido assim. Outra coisa que me chamou a atenção foi o fato de sempre estar aparecendo novas dificuldades durante o decorrer do sonho, uma após outra e assim por diante. Pus aqui apenas uma parte do sonho da qual me recordo mais claramente, mas houveram vários outros momentos. Essa coisa de sempre aparecer novas dificuldades onde a visão anterior não enxergava tais dificuldades é um reflexo direto do nosso dia-a-dia, onde tudo está sempre em constante mudança, e essas mudanças trazem novos desafios e novas oportunidades e assim vamos construindo algo ao qual chamamos vida, vamos construindo nossas dúvidas e nossas certezas (embora essas últimas sejam mais escassas). Ao decorrer dessas mudanças que vão aparecendo, ao decorrer dessas mutações, dá-se algo à que atribuímos o conceito de tempo. Esse conceito de tempo está arraigado na sociedade e cultura em que estamos inseridos há séculos e nos faz aderir à uma organização sistemática do tempo e da vida que nos é imposta desde o momento em que nascemos. A grande diferença do sonho é que o conceito de tempo é extinguido, quebrado pela raiz. O que pode ter durado 10 minutos no "tempo real" parece ter sido uma existência num sonho e vice-versa. O que muitos não compreendem é que o que vivemos nesse estado que chamamos de "desacordado" onde sonhamos também é fruto direto das energias que confluem para formar nossa pessoa, nosso ser. Então também é nossa vida, também é "a gente vivendo". Depois que descobri que sonhar também é viver, minha relação com os sonhos se tornou bem mais saudável e me trouxe alguns conhecimentos, além do prazer de sonhar. Prazer em sonhar. É assim que penso sobre os sonhos hoje. Há quem diga que durmo demais, talvez eu mesmo o diga em algumas ocasiões. Enfim, durmo só porquê é assim que consigo sonhar. Se não existisse o sonho talvez eu nem durmisse, ou talvez se eu pudesse sonhar acordado, aí é que não durmiria, mas viveria num eterno "rêver" (sonhar). Opa, espera um momento, quem disse que eu não posso sonhar acordado?! Posso sim.

Marcus T.

PS.: Que revolta foi essa contra a nossa querida nação, Mago?!

domingo, 9 de setembro de 2007

Variações sobre o mesmo tema (fogo) saindo do tom.























Põe fogo em minha fala!




Enquanto falo a palavra fogo,
a fala me foge
e o fogo me consome.

Ao invés de falar as palavras, escrevo-as.
E, uma vez escritas,
atiro-as ao fogo.

Ao mesmo fogo que um dia me queimou;
ao mesmo fogo que um dia me deu luz
para ler as palavras que queimei;

Ao mesmo fogo que um dia abraçarei
em busca de palavras que não queimei,
mas que também não disse.

Não disse por medo de queimar-me.
Não disse por medo do fogo.

Fogo que agora me queima,
enquanto falo a palavra fogo.

Enquanto queimo eu mesmo a mim mesmo,
falando fogo, fogo, e me afogo sem afago.




Marcus T.























(Pinturas: Lorenzo Mattotti)

Uma imagem, uma frase, uma imagem



Uma imagem é o momento sem tempo em que existimos.





O tempo não começa nem acaba, nós é que não continuamos.





Ver e olhar são de alguma forma sinônimos mas não o mesmo; ver é uma atitude, percepção de quem procura ou encontra. A fronteira entre o olhar e ver é onde o fotógrafo se inscreve, a matéria-prima, a acção com que escreve momentos, ideais que perduram e intervêm, no pessoal de cada um e na memória colectiva da Humanidade.


Pinturas: Lorenzo Mattotti
Escritos: João de Castro

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

FOGO NA FALA

Fogo em minha imagem;
Minha singela existência, sem desejo de explicações.
A fala entorpece, falha e cansa.
Fogo aos discursos!
Sou uma paródia em traje estudantil.
Na escrita há algo mais preciso, revela diretrizes impulsivas de pensamentos que por muito não reflete a minha imagem na dose, quantia (e que seja ou não falácia), a fala corrompe e envergonha ainda mais.
Que não haja razão nas próximas existências;
Fogo nas casas prédios e estradas, nesse chão por baixo há outra história com mais vida, morta, que o asfalto tapou (Rodrigo Lima, 2000).
A escrita incorpora mais exuberância, leva ao chão, tem poder em apontar a existência simplória para lugar algum (desnortear), milhas a frente, o tempo não corrói.
Fogo neste texto, fogo neste tempo. fogo (!) na existência.

Fogo em minha imagem;
Minha fala incorpora meus desejos e repulsa desta existência.
A voz clareia os rumores de anseios, insulta e interfere; rasga!
Fogo em minha voz!
Sou uma platéia que escuta o sobressaltar da voz maior.
Na fala desenha-se um caminho, revela bifurcações, enxerga-se dúvidas cara a cara, eu grito aos pensamentos que me surgem para espancar, desafiar, é o grito da dor de existir.
Que haja um impacto vital a cada existência tal como retóricas deste tempo, para protestos oposições e escutas à Fala.
Fogo nos olhares indignados;
Que ascendam à singularidade de cada filho desta terra, que encoraje ou admita seu próprio temor na batalha.
Na fala há o poder sobre a condução, desde o mais alto escalão, ou o enfatizar refletido da mais dolorosa queda, para dar cara ao chão, para renomear ilusões, e sugerir rédeas (novamente).
Fogo para cada um. Fala para lutar com a dor. Fala para acalmar o ardor. Fala! Para direcionar uma existência, mesmo que múltipla, mas composta de um corpo crescido paulatinamente para o fim de um impulso revigorado na exuberância adquirida pela existência e o controle de si, então que assim seja, pela FALA!



... o coelho que foge ao fogo sem ritmo, nem falhas.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Blá Blá Blá "!@#$%¨&*()_+}


The Broken-mirror of i...
A Lenda da Cadeira sem o eu
na escrita do hoje

atemporal...

Eu não sei de nada, fico rindo me olhando pensar em escrever, e agora me sinto ainda menor. Cada vez que tenho uma brecha para fitar as artes compostas por meus parceiros, o que provem da mú
sica junto em ressalto a sétima arte, é como se saísse da caverna do meu corpo, visse tudo que faço, sacar-se o que rodeia. Minha sorte é que me divirto comigo mesmo, meus pensamentos, meu humor escuro de zombar de quando penso que sou pequeno ou de quando me vejo útil, é como se falasse: “não importa o quanto você tente se apagar, amigo, teu reflexo já é algo do interior para fora dos olhos de outros grãos andantes”.
Já quis apagar-me diante do espelho, quebrei o espelho, lá estava eu esmiuçado, ridículo.
Bernardo Bertolucci! Bernardo Bertolucci é cinema! Às vezes eu penso que
ele nem existe (pra ridicularizar minha exaltação), e diante de suas películas me sinto ser seus olhos, porque eu só absorvo o tempo todo, e ganho pagando tão pouco pelo sentimento ( son of a bitch!), e eu sou um da platéia com sabor exótico na boca, o sabor da contemplação, eu sou a boca de LUCY e sua personalidade, meu deus! O que compõe a conjuntura daquela performance é meu eu feminino, paralelo pode-se postar um quadro pintado dos rumores frenéticos do interior do cosmo Gilson (ser vagante. às vezes eu sinto que enquanto eu estou num “pasto” fazendo coisas, chorando, sorrindo, rompendo, ele está na mesma posição em outra intensidade como coisas que podiam ser paralelas na mesma direção, direção alguma, somente se empurrando desde o nascimento, a gente atravessa as ruas por causa do primeiro impulso que “diz”: -agora tu começas e não parará jamais) .



Thom Yorke compõe trilha de pensamentos que não seriam possíveis sem sua melodia, penso eu, faço inferências com isso atirando pra todo lado com a boca, como charlie kaufman personagem de Nicolas Cage em Adaptation. Dessa existência eu pretendo ser algo que provoque sorrisos; da graça, de graça, do ridículo, da timidez, do êxtase, do absurdo, para que todos voltem para mim sem que eu perceba. Depois de tanto tempo, e percebendo a mudança constante na demais existências, descobri que amar uma mulher é um êxtase, meus caros, para mim, um êxtase (em uma unidade mais)! Nenhuma mulher como concebo deixa-se como estou, voltado para uma condução de si bem sentida, desde a pele numa visão rotatória e penetrante em outros as esquinas, nenhuma mulher transfere para dentro o baú de destroços fragmentados, límpidos como o cinema. Nenhum cinema substitui o calor de um abraço almejante, e nenhuma solidão composta pela imaginação constitui tal percepção em tal intensidade. É o papo de dizer que um é melhor que outro, na idiotice de esquecer de enxergar que substituição só existe pelo que concebemos como seres humanos, e o que mais é o mesmo? Duas árvores da mesma espécie não compõem a mesma estética ao pé e traços por mais minúsculos que aparentem. Não caia nas minhas certezas, se eu sou o que mais rejeita axiomas e retóricas! Escrevo compulsivamente rumores, falácias. Eu outro dia pensei que ao colocar fones e aumentar o volume eu estava projetando mais uma vez meus receios e hostilidade à mão que afaga meu coração, a dona música, e ao rotular vestígios e traços de uma certa patologia quase me espanco no segundo posterior pra ver o sangue do meu ridículo. Antes de qualquer coisa sou nascimento e movimento (posteriormente algo que se diz por instinto nesta expressão), depois do manuseio pela conduta, do C.I.S (centro da interação por socialização) sou qualquer merda que faz leitura e entendimentos duvidosos. Necessários quando preciso de um traje um cenário e uma atuação para sobrevivência superficial. Não quero escrever mais nada...

... I can see the sunset over me!

domingo, 26 de agosto de 2007

Uma Unidade Mais

-Uma visão por palavras sem sentido. (Nada faz sentido em essência.) Razão é uma projeção dos racionais apenas. A luz do sol projeta a sombra da árvore, para nós há razão pela sombra ser, “para o sol” nada, para o cão um descanso, para um louco, um vislumbre. Saber que “você” leitor sabe disto é um conforto, se não, é regresso.

Juliano

(nome: conjunto de letras, rabiscos) %$&I%Ö#PG

Atuando sobre a existência, ser algo que vai para outro..., A todo instante ser aleatório, sentir o calor que pelas palavras traz ou desconforto ou o ridículo. Conter-se é ser como não se é (em essência), agora se sente o que não pudera imaginar, somente sentir pela mão ato de quem escorregou das certezas absolutas e trouxe o que forma não tem, mas o que há é o impacto da forma como é tudo que existe o tempo todo e você nunca esteve dentro. Entenda como um som sem sentido (sem sentido denominado), sem as alusões do mundo/razão, seria um esforço apalpar a face do outro lado de fora do habitar das classificações? Acaracterizado não existe; há razão por tudo ser o que se compreende agora, (é esta uma a mais.) foi à indução do ser no esboço forjado para um determinismo arquétipo. Pode-se também tentar ridicularizar; a sensação que estas 13 palavras constrói agora é o que se expressa como "unidade simplória" que todos percebem sobre todos, seria um esforço querer dizer que o que há como forma que não se entende é tão natural quanto alguma palavra legível. A classificação que faz desta representação agora não pode ser uma unidade apenas, e sim uma unidade mais. Aclassificação existe em essência; em essência somos sim seres padecentes, em essência somos qualquer coisa a mais, qualquer coisa outra, e nossa condição (do agora) é apenas uma unidade mais. Adenominação existe em essência; -teu nome, meu nome, palavras são padrões e em conjunto, razão, e toda forma todo conjunto é o que é só por assim admitir-se e assim dizer. Outra coisa também o é, outra coisa que não é o que se aprendeu, outra coisa que torna esta condição uma unidade mais. A vida não se permite em uma condição apenas, e se assim se permite o ser existir por haver apenas ordem, controle, entendimento, é medíocre. Se tua vida é uma unidade apenas, és medíocre para com, se te ofendes porque te chamo por medíocre, acabas como um (vil) pobre para vislumbres. Se, tentando esmiuçar sou desordem, caos é o que jaz aqui, e se nada para ti sou, se sou pobre, se sou louco, se sou astuto como um perdido, te digo agora que sou uma unidade mais oferecendo a mão para um possível abraço.-

%$&I%Ö#PG

domingo, 19 de agosto de 2007

2001 – Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick


(1968)

Lá pelo meio de 2001 – Uma Odisséia no Espaço, filme clássico do genial Stanley Kubrick, em meio ao prenúncio de desespero que a seguir se faria presente a bordo da nave, o que chama a atenção é a candura sussurrante da voz de Hal. O som sugere mais do que o próprio desenrolar das imagens: não é uma voz metalizada – mais parece mentalizada, com o timbre conclamando ou sugerindo uma calma e repouso sem tempo de duração. A narração original, da voz de Hal, sugere um apaziguamento demasiado, como se dissesse ao nosso inconsciente: “— calma, você irá morrer, mas será muito calmamente”. E como se ainda fosse consolar: “— vai morrer dormindo, como no sonho de todo humano – sem dor”.
Não há ira na morte, apenas seremos substituídos. Não há vingança, só o aceno de que a substituição pelo mecanismo é irreversível, irremediável: “o melhor é morrer mesmo”; ou melhor, “você está quase dormindo, em vigília, irá morrer ou está morrendo aos poucos, conforme aceite o sono da morte”.
É sugestivo que ao final do filme a cena seja a de um astronauta (aparentemente barbado, desgrenhado), quase levitando, formando imagens que se fundem em sua inconsciência, surgindo idéias em bolhas, fugidias, perdidas, desregradas, desprendidas: “como se sem as máquinas, sem os mecanismos, a mecânica e a técnica, só restasse o devaneio”. E nisso a profecia de Hal irá se cumprir: “não me desligue porque você irá morrer; mas, se não desligar, também não estará morto?”.
Talvez o que se perca com Hal seja nossa inocência, pureza de sentidos, ingenuidade em crer num mundo em que nossas próprias criações sejam sempre boas, como se o humano fosse sempre bem-vindo. Hal é a supermáquina do bem, a que provém de tudo a todos, mas que se transforma em máquina de guerra. A nossa própria guerra interior, oscilando entre o bem e o mal: “Hal é nosso mais bem acabado sonho de grandeza”. E por isso mesmo é capaz de revelar a maior pequenez: “todo sonho de conquista é pequeno em essência, porque não gera nada, não cria, não adiciona, apenas adere, adquire, anexa”. É a soma-zero de que já falava Maquiavel.

A inteligência coletiva é a nossa 2ª pele, sim, como toda a informática. Mas também é o desencantamento do mundo de que falava Weber: a vida, as histórias, jamais seriam as mesmas depois da descoberta do monolito (no filme) e depois da descoberta da técnica na vida dos primatas (há um milhão de anos).
Não é o macaco quem inventa a pedra lascada e depois a polida. No longo curso da história dos hominídios, são o Homo Erectus, o Homem de Neandertal e, por fim, o Homo sapiens, quem seleciona, promove e implementa essa reconhecida inteligência tecnológica de um milhão de anos, ou seja, a mesma idade de Hal. O monolito negro também simboliza o uso da pedra como artefato, instrumento, meio ou prolongamento dos sentidos humanos (um martelo está para a mão cerrada, como a mão espalmada sugere um golpe de faca, pérfuro-cortante).
Hal é princípio e fim. É o modelo cibernético, o guia e a direção que ainda nos acompanha. Hal não é farol, porque não ilumina; apenas indica. Hal é a tecnologia política, sem pólo positivo ou negativo, é o bem que provoca o mal, porque já o traz dentro de si: se fosse unilateral a coisa mudaria de figura e, apesar de não me parecer que seja esse o caso, as pessoas são livres para entender de outra forma.
Hal é um elo que sempre nos ata, arrasta direto ao passado que também não era, nunca foi, idílico. Por isso, não é maniqueísta, estando para além do certo e errado, nem simplista (se fiz isso, vai dar naquilo) e muito menos idealista (a inteligência artificial é nosso futuro ou já é presente). Também não é superficial: “quem quer ser um Hal ou tê-lo por perto?”.
Mas, ao contrário de nosso homem-macaco - do período do monolito e anterior, portanto, ao neolítico - Hal não é suficientemente social, não foi criado para a interação, para o grupo, para partilhar qualquer coisa que seja, simplesmente porque não é solidário. O que sugere essa afirmação é o fato de se terem encontrado esqueletos de hominídeos com múltiplas fraturas – sugerindo, assim, que havia ajuda mútua no tratamento e na recuperação dos enfermos e acidentados. Pois, de outra forma, é óbvio, não teriam sobrevivido.

Não fosse pela voz suavizada, aveludada, Hal não seria antropomórfico (a nossa imagem e semelhança, como o Robô, de Perdidos no Espaço), porque a sonolência é a mesma que nossa mãe ou avó nos proporcionava quando bebês. De outra forma, no entanto, Hal é antropomórfico: “porque é vida e morte, nosso ciclo perpétuo, nossa consciência de incompletude, nossa fraqueza de espírito – desejo infinito de posse e propriedade -, porque como os únicos animais sabedores da morte, somos incapazes de detê-lo”. E Hal sempre estará aí para nos lembrar disso tudo - a nós, animais fracos e imperfeitos, diante da lógica matemática e simétrica da linguagem das máquinas.
Hal não é inteligência artificial, é a inteligência tecnológica, do passado para o fututo e vice-versa: “somos nós e, por isso, não pode ser artificial. É real: do monolito à rede mundial dos computadores”. Ou será que o monolito é a rede, a web de que falamos hoje? Uma consciência cósmica ou espécie de esforço sideral?
Um esforço sideral capaz de reunir as forças cósmicas espalhadas pelo universo iria além da força cinética, entre os astros. Assim, se religado, Hal será obediente às forças siderais, será capaz de desvendá-las para ele mesmo? E para nós, que surpresas traria ao nosso conhecimento se estivesse ao deus dará ou sob seu próprio comando no infinito labirinto do cosmo?
Então, por que Hal? Certamente, um questionamento que deve ir além das inscrições IBM.
Hal é pergunta ou afirmação?
Se interroga, fá-lo a nós: “— por que fui criado?”.
De nossa parte, deveríamos perguntar a nós mesmos: “— por que o criamos?”.
Ou faz a si mesmo: “— o que farei depois de derrotar os humanos, serei mais humano do que antes, do que eles próprios?”.
Assim, se ele se afirma, ele nos nega? Se Hal é nossa negação, é porque deveria ter outra proposta - mas qual será? O que fará depois de nossa aniquilação?
Afinal, a negação (Hal) da negação (nós), supõe alguma afirmação. Mas não se tem isso no filme. Daí, posso concluir que o filme não é dialético, mas linear, ainda que não seja maniqueísta?
Outros dirão, de maneira oposta, simplesmente que isso não é suficiente pra dizer que ele não é dialético, porque: 1) se há negação dialética, então há afirmação; 2) mas em outra perspectiva, se nós somos a afirmação, Hal é a nossa negação (porque não é exatamente a nossa superação) - e a negação da negação estaria na instância da recepção, que é o espectador do filme. Sinceramente, não sei se devemos pensar dessa forma, mas também não sei se não devemos.

Enfim, ainda seguindo essa linha de abordagem, primeiro, Hal não sugere vingança (alego a sua legítima defesa, ante o fato de ser desligado e negado pelos humanos): a) em parte porque não teria empregado a exata simetria entre ação e reação; b) mas sobretudo porque não é perverso e, para tanto, basta relembrarmos de algumas máximas maquiavélicas - tipo: “matar todos os inimigos de uma única vez, em praça pública” - ou mesmo lembrar que seu antecessor Vlad – O Empalador, um príncipe romeno, inspirou a lenda do famigerado Conde Drácula. Para Hal, entretanto, a morte deve ser silenciosa, um susssuro, um sopro final rumo ao infinito universal... (os astronautas são despejados da nave, ficando à deriva silenciosa, sob o olhar complacente do diretor).
Nisso, Hal seria humano demais, um turbilhão entre o bem e o mal? Outros dirão que não se trata do super-humano, alegando que se Hal não tem corpo, também não tem alma. De fato, Hal apresenta-se apenas como um olho vermelho, observador de tudo, inflexível e vigilante: uma metáfora do olho mágico que nos espreita em todas as portas, canais de TV internos, e está postado em todos os giroflex dos carros de segurança. Mais precisamente, a alma, aqui entendida, é essa área cinzenta entre a benevolência, compaixão, piedade ou crueldade, violência, incapacidade de perdão. No entanto, essa não poderia ser uma definição de poder ou ganância, temas tão caros aos homens?
Comparado a Blade Runner, por exemplo, neste a morte surge como uma inevitabilidade, pois o replicante não se vinga do criador, não o mata por prazer, mas por perceber definitivamente que nunca será inteiro, integral, íntegro em sua consciência de humano. Se fosse mero ato de vingança, ainda teria diante de si uma escolha: vingar-se, matando, ou não. Com a morte do criador, o replicante termina seu próprio ciclo de vida. O que, portanto, não é um basta.

Ainda pensando de acordo com a trilha iniciada, que Hal não é dialético, a leitura possível seria somente a psicológica? Se sim, onde estará a poesia da sétima arte? É mera antecipação de Matrix? Mas, e a história não poderá revelar algum outro significado? O que se tinha no momento histórico em que se filmava e produzia 2001? Estava em gestação (ou ainda se gesta) um tipo qualquer de Teoria Informática Conspirativa?

A sensação de suspensão do tempo, certa lentidão e passividade, com que o filme se desenrola não será à toa. Como se o espaço sideral, por um lado, sugerisse a perda dos sentidos e significados (nada menos dialético). E visto por outra dimensão, como se indicasse a própria dinâmica da história, da passagem da humanidade sobre a Terra, uma passagem lenta, gradual e insegura ou lenta, afirmativa, com poucos ou alguns rompantes: das Revoluções Industriais, seculares, do século XVIII ao XX, à ruptura e reconstituição da estrutura da matéria feita em O Exterminador do Futuro, com as ligas de metal mimético, interativo, e que também lembra os fractais em ebulição. De todo modo, trata-se do curso da vida humana: destrutivo, lento, vagaroso, maçante. Porém, sempre constante, incontrolável, inseguro e sem certezas. Simplesmente porque há mais perguntas do que respostas na história, no curso da humanidade, como também no filme.
Para mim, é um filme custoso, chato de ver, rever, assistir. Nele, a dinâmica é substituída por essa espécie de estática – nada pior do que supor que há um curso para o fim, e de um fim em que não há promessa de recomeço. O fim do filme sugere só o delírio do astronauta, o nosso mesmo.

Não há, assim, um fim possível? Se seguisse Deleuze, citado por Pierre Lévy, quando descreve o virtual, a única resposta é um não sonoro. Nosso futuro, nessa linha, bem como o passado e o presente, não passaram de um possível, da mera possibilidade sem força para se realizar, instrumentalizar.
Mas só há esse possível, essa possibilidade? O filme sugere que sim, um futuro de possíveis, isto é, sem nada de significativo, sem significantes e atuantes. Não há, portanto, um futuro virtual, uma promessa de vida que nos magnetize, energize e simbolize um devir-ser. Não é nem o dever-ser, quanto mais o devir-ser: esse nós de outra forma, rearranjados, recompostos. É a solidão sem arranjos ou compostos. Será apenas um sonho decomposto? Será que é chegado o tempo em que os opostos se equipararam tanto a

Vamos escolher outro filme para nós mesmos?

Ao contrário do que parece, Hal não é a história cronológica, é a característica da invenção técnica, portanto, sempre presente, é o vai-e-vêm. Hal é só um estágio, para o bem e para o mal. É estágio de nossa vida.

Meu nome, nosso nome, é Hal.


E sendo assim, podemos perguntar, por fim: “— o que você quer, Hal?”.
Quem é, o que quer, de onde veio, nós sabemos, mas o que ele quer, não...
Hal, realmente, tem-me feito pensar se sou uma pessoa inteligente, se há alguma inteligência nisso tudo e, se houver, de que tipo de raciocínio, lógica, capacidade intelectiva, produtiva, criativa estamos falando ou, então, se há algo que nos interessaria mais de perto.

Hoje, porém, não me socorro do próprio Hal, não vou pedir sua ajuda (só vou digitar, novamente, como único recurso emprestado), pois prefiro pensar sozinho e tecer por conta própria minhas próprias idéias – se bem que não exatamente minhas, porque são idéias que se articulam e se entrelaçam (alinhando-se e desalinhando-se) numa rede que nem sabemos direito como é que existe.

Por hora, vou só, e ainda que venha a convidar a muitos outros para ao menos saber do trajeto e da bagagem que deveríamos levar para uma viagem como essas. Mas, será que alguém se interessa pelo roteiro dessa nossa nova viagem? Sei lá, arrisco-me a contar o trajeto e mais tarde verificar se mais alguém embarca junto (penso que não é canoa furada) – afinal: navegar é preciso (é urgente e mesmo que nem sempre tão correto assim).

Vinício Martinez
é professor da UNIVEM – Universidade Eurípides de Marilia
e Doutor em Educação pela USP
(2004)

sábado, 18 de agosto de 2007

Bolha de percepção

Mago,
li teus textos dos dias 14 e 17 de agosto, e comecei fazendo um comentário acerca do que havia acabado de ler e, consequentemente, de conjecturar sobre. Só que o comentário começou a crescer, crescer, e transformou-se em um texto, que resolvi postar, porém, a título de comentário.

"Creio que existem várias classes de "momentos" para serem vividos por nós, porém quero descrever aqui duas dessas classes, sobre as quais eu passo minha humilde vida variando entre uma e outra. Vou tentar esclarecer meus pensamentos a respeito.
O primeiro desses "momentos" aos quais me refiro é bem exemplificado por aquelas horas íntimas em que estamos no nosso próprio quarto, lendo um livro que deveras nos interessa, repleto de "ensinamentos" acerca de como perceber o mundo externo e interno a nós (metaforizado ou não), sejam esses "ensinamentos" vindos em forma de poesia, relatos, romance, etc.; ou então naquelas outras ocasiões onde conversamos com nossos queridos amigos sobre o que entendemos do mundo "lá fora" e "aqui dentro". (Essas ocasiões onde conversamos com os mais chegados pode até estar em uma classe intermediária de "momentos", entre a primeira e a segunda). Com esses momentos (que, claro, não se resumem a livros, filmes, conversas, ou apenas pensamentos) nos preparamos e buscamos entender o que está dentro de nós, embora nunca alcancemos a totalidade dessa compreensão.
Já, o segundo dos "momentos" pode ser bem representado por ocasiões em que nos vemos em meio a um evento social, por exemplo, ou em uma grande festa de família, ou até no meio da rua. Essas ocasiões exigem que nos portemos de modo a mostrar quem somos exteriormente. As pessoas que nelas se encontram, na maioria, nos julgam pelo que aparentamos ser, embora as mais sensíveis nos percebam pelos nossos olhares ou gestos (o que fala uma linguagem bem mais próxima do que realmente somos). Enquanto estamos percebendo os outros, os outros nos percebem. E nessa troca de percepções nos descobrimos ao passo que descobrimos também o diferente. Não adianta ficar fechado em uma bolha de individualidade onde a única lei de interpretação do mundo é a sua própria, há de haver algo sempre novo, sempre um aprendizado, sempre uma mudança. Assim vamos lapidando a nós mesmos, assim vamos conhecendo a nós a aos diferentes, assim vamos olhando e "vendo", ao invés de criar uma imagem bem distante daquilo a que se olha, ao invés de ficar criando um mundo próprio dentro de uma bolha e esquecer que se pode crescer.
Eu gozo no meu mundo, gozo quando estou na minha bolha. Mas também tento gozar ao sair dela, também tento gozar ao perceber as bolhas alheias.
Talvez precisemos nos preparar para algum dia estourar a bolha, rasgar a bolha. Ou melhor, tornar ela difusa, ao ponto de estar entranhada mesmo na existência de todas as outras coisas exteriores a nós. Fazendo com que nós (cada Eu) estejamos fazendo parte de uma unidade maior que nossa individualidade forçada e mesquinha, fazendo com que nos tornemos menores e maiores ao mesmo tempo. Vale salientar que não precisamos invadir, de maneira alguma, as bolhas alheias. O que precisamos é enxergar que essa bolha na qual estamos ofusca nossa percepção do mundo como um todo, que nossa percepção pode se estender bastante, que a maneira à qual estamos habituados a viver e a ver o mundo é que ofusca essa percepção, é que nos tolhe."


Marcus T.

A Carlos Drummond de Andrade

João Cabral de Melo Neto




Não há guarda-chuva
contra o poema
subindo de regiões onde tudo é surpresa
como uma flor mesmo num canteiro.

Não há guarda-chuva
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.

Não há guarda-chuva
contra o tédio:
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.

Não há guarda-chuva
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.

Não há guarda-chuva
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.


(Foto: Gravatá hoje. - Marcus T.)

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Copo Vazio



















(Foto: Piano do Vô - Marcus T.)

É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar

É sempre bom lembrar
Que o ar sombrio de um rosto
Está cheio de um ar vazio

Vazio daquilo que no ar do copo
Ocupa um lugar
É sempre bom lembrar, guardar de cor

Que o ar vazio
de um rosto sombrio
Está cheio de dor

É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar

Que o ar no copo
Ocupa o lugar do vinho
Que o vinho busca ocupar o lugar da dor

Que a dor ocupa a metade da verdade
A verdadeira natureza interior

Uma metade cheia
Uma metade vazia
Uma metade tristeza
Uma metade alegria

A magia da verdade inteira
Todo-poderoso amor

É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar

(Gilberto Gil, Copo Vazio)

... Do que houve

Veio outro. Veio até minha porta, veio ele, e me disse para sair.
Saio eu, entra ele, eu apenas observo, não sou seu servo, ele eu sou (a rodovia de si).
Muda os padrões, pontos de vista descartáveis, e tudo muda para sempre, a escolha me permite unicamente reparar o decorrer até que se consuma. Jogo uma perna, lanço a outra, movo os membros, percebo as idéias, interfiro com as idéias e o corpo imóvel, sou invisível, rápido, como não pude eu perceber antes? Eu volto para dentro, calmo vejo tudo tão rápido, para a esquerda vejo a imagem central, existência circular, sou a mesma imagem sempre se desfigurando no absurdo abstrato de minha percepção “ambígua” da existência. Sou vibração, afeto (o meio), na continuação, sou a constituição das emoções desordenadas. Vejo o horizonte estou para dentro e fora, que distância entre duas percepções! Quando acordo, vivi um sonho sobre sensações decoradas nunca sentidas, o beijo o sorriso a lágrima (o sexo). Veio ela, ela se foi, ela é tão bela eu não entendi (nem me era para ser) sua chegada e partida, eu a beijei, eu abracei, ela foi embora, nua, eu voltei a dormir (ou construir?), ela canta, ela é várias eu sou vários, perpassa minha existência e eu nada sou. De seus olhos aos meus era a extensão do idílio, eu nada controlo, nem minha vida dormente. Sonhei que eu tanto podia, até morrer. Nunca há precisão, são percursos, talvez rumores dos desejos, é vida, foi algo, quando se lembra (vigorosamente) é quase memória do que não foi. É confusão, que bom então. Não há razão; onde está o perigo de cá, porque do lado de lá... Vai, e nada procura (!) que tudo vem. Ah!

Catalisador

sábado, 11 de agosto de 2007

Porta Para o Infinito

Castañeda narrando uma de suas experiências com Dom Juan e Dom Genaro, no livro "Porta para o Infinito" (4° da série que descreve os ensinamentos de Dom Juan).

"(...) Tentei levantar-me e fui preso da mais absurda distorção sensorial. EU não tinha controle sobre meu corpo; na verdade, meu corpo nem parecia me pertencer. Era inerte; eu não tinha ligação com nenhuma de suas partes e, quando tentei levantar-me, não consegui mexer os braços e fiquei me contorcendo indefeso, de barriga para baixo, rolando de lado. O impulso de minhas contorções quase me fez dar uma volta completa, tornando a ficar de bruços. Meus braços e pernas esticados me impediam de virar-me e fui parar de costas. Nessa posição, vi de relance duas pernas de forma estranha e os pés mais distorcidos que jamais vira. Era o meu corpo! Eu parecia estar envolto numa túnica. A idéia que me veio à mente foi que eu estava experimentando uma cena de mim mesmo como aleijado ou inválido. Tentei curvar as costas e olhar para minhas pernas, mas só conseguia sacudir o corpo. Estava olhando para um céu amarelo, um céu de um amarelo-limão, forte e profundo. Ele tinha fendas ou canais de um tom amarelo mais profundo e uma porção de protuberâncias penduradas como pingos de água. O efeito total daquele céu incrível era arrasador. Eu não conseguia saber se as protuberâncias eram nuvens. Havia ainda zonas de sombras e zonas de diferentes tons de amarelo, que fui descobrindo ao mexer a cabeça de um lado para o outro.
Aí alguma outra coisa atraiu a minha atenção: um sol no zênite mesmo do céu amarelo, bem sobre minha cabeça, um sol fraco - a julgar pelo fato de eu poder olhar para dentro dele - que lançava uma luz calmante, branca e uniforme.
Antes de ter tempo de ponderar sobre todas essas visões extraterrenas, fui violentamente sacudido; minha cabeça pulava para diante e para trás. Senti que estava sendo erguido. Ouvi uma voz estridente e risadas e defrontei-me com um espetáculo realmente espantoso: uma mulher gigantesca, descalça. A cara dela era redonda e enorme. Seus cabelos negros estavam cortados no estilo pajem. Tinha braços e pernas gigantescos. Pegou-me e levantou-me, pondo-me em seus ombros, como se eu fosse um boneco. Meu corpo estava flácido. Olhei pelas costas dela. Tinha uma penugem fina em volta dos ombros e pela espinha abaixo. Olhando para baixo, dos ombros dela, tornei a ver aquele chão maravilhoso. Eu o ouvia ceder, elástico, sob o peso imenso dela e via as marcas de pressão que seus pés deixavam nele.
Ela me largou de bruços defronte de uma estrutura, uma espécie de prédio. Aí notei que havia algo de errado com a minha percepção de profundidade. Não consegui avaliar o tamanho do prédio, olhando pra ele. Em certos momentos, parecia ridiculamente pequeno, mas depois que eu, aparentemente, ajustei minha percepção, fiquei realmente maravilhado com suas propoções monumentais.
A moça gigantesca sentou-se a meu lado e fez o chão ranger. Estava encostado a seu joelho imenso. Ela cheirava a bala ou morangos. Falou comigo e eu entendi o que ela disse; apontando para a estrutura, ela me afirmou que eu ia morar ali.
Meus poderes de observação pareceram aumentar, quando venci o choque inicial de me encontrar naquele local. Reparei então que o prédio tinha quatro lindas colunas não funcionais. Nada sustentavam; estavam em cima do prédio. Sua forma era a simplicidade total; eram projeções longas e graciosas, que pareciam se estar estendendo até aquele céu assombroso, incrivelmente amarelo. O efeito daquelas colunas invertidas era de pura beleza para mim. Tive um acesso de êxtase estético.
As colunas pareciam ter sido feitas de um só bloco; eu não podia nem conceber como. As duas colunas da frente estavam ligadas por uma trave fina, uma barra de comprimento monumental, que, pensei, podia ter servido como parapeito ou varanda.
A moça gigantesca me fez deslizar de costas para dentro da estrutura. O telhado era negro e plano, coberto de furos simétricos, que deixavam passar o brilho amarelado do céu, criando os desenhos mais complicados. Fiquei realmente assombrado com a completa simplicidade e beleza alcançadas por aqueles pingos de céu amarelo aparecendo por aqueles furos preciosos no telhado e os desenhos de sombras que eles criavam naquele chão magnífico e complicado. A estrutura era quadrada e, fora de sua beleza tocante, ela me era incompreensível.
Meu estado de exaltação era tão intenso naquele momento que tive vontade de chorar, ou de ficar ali para sempre. Mas alguma força, ou tensão, ou algo de indefinível começou a me puxar. De repente, vi que estava do lado de fora da estrutura, ainda deitado de costas. A moça gigantesca se encontrava lá, mas com ela havia outra criatura, uma mulher tão grande que chegava até o céu e tapava o sol. Comparada com ela, a moça gigantesca não era mais que uma menininha. A mulher grande estava zangada; agarrou a estrutura por uma de suas colunas, levantou-a, cirou-a de pernas para o ar e largou-a no chão. Era uma cadeira!
Aquela percepção foi catalisadora; desencadeou percepções arrasadoras. Passei por uma série de imagens desconexas, mas que podiam figurar como uma sequência. Em lampejos sucessivos, vi ou percebi que o piso magnífico e incompreensível era uma esteira de palha; o céu amarelo era o teto de estuque de um quarto; o sol, uma lâmpada; a estrutura que provocara tal êxtase em mim era uma cadeira que uma criança virara de pernas para o ar para brincar. (...)"